Ilustración de Gorka Olmo
Publicado originalmente no site do jornal EL PAÍS BRASIL, em
30 de março de 2020
Como você está lidando com tudo isso?
Conselhos para reduzir a inquietude de estar confinado em
casa por causa do coronavírus. É hora de tirar algo positivo desta pandemia
Por Francesc Miralles *
Pensávamos que essas coisas só aconteciam nos romances
distópicos ou em locais remotos. Mas o que vivemos na própria pele afeta a
todos, ricos e pobres, e em todas as partes, o que é uma boa lição de
humanidade para a espécie humana. A fotógrafa Flore Beleva expressou a sensação
recentemente desta forma: “Sinto medo porque agora, quando vejo uma série,
parece que os atores têm uma vida real e que a minha vida é a de ficção
científica.”
O que no início parecia divertido — ficar em casa vendo
séries na Netflix, arrumando armários ou lendo livros que não tínhamos tempo de
ler — tornou-se uma angústia que se traduz numa infinidade de perguntas sem
respostas precisas. Até quando isso vai durar? É certo que 70% das pessoas vão
se contagiar? Terei trabalho quando o pesadelo acabar? O que acontecerá com a
economia mundial? As coisas voltarão a ser como antes?
Esta última questão é a que pode ser respondida de forma
mais certeira: não, o mundo não será mais o mesmo, mas não necessariamente será
pior. Se tomarmos estas semanas de alarme e confinamento como um período
obrigatório de reflexão, sobre o mundo e sobre a nossa própria vida, em alguns
aspectos podemos vivenciar uma mudança benéfica.
Para que isso seja possível, no entanto, é importante não
sucumbir ao pânico e ao desespero enquanto durar essa situação inimaginável até
há poucos meses. Vejamos alguns conselhos para enfrentar este retiro forçado
com um enfoque positivo.
Dosar o acesso às notícias. É bom se manter informado sobre
a evolução da pandemia. Mas, se consultarmos as redes sociais de forma
compulsiva, a cada poucos minutos, só conseguiremos alimentar a ansiedade.
Entrar em sites confiáveis duas ou três vezes por dia é suficiente para saber o
que está ocorrendo.
Praticar a resiliência através da ação. Resiliência é a
nossa capacidade de superar as adversidades. Assim, se fizermos algo útil em
vez de traçarmos cenários catastrofistas em nossa mente, nos sentiremos muito
melhor.
Humanizar. O lado bom desta crise sem precedentes é que, ao
nos sentirmos vulneráveis e com uma enorme quantidade de tempo, estamos
desenvolvendo nosso sentido comunitário. As pessoas que moram sozinhas recebem
telefonemas diários, e os amigos despreocupados agora entram em contato conosco
para nos perguntar: “Como você está lidando com isso?” Como é um mal que afeta
a todos, sentimos no ambiente mais empatia e disposição de ajudar.
Valorizar o minimalismo. Um dos presentes do confinamento é
descobrir que, na verdade, necessitamos de muito poucas coisas para viver.
Podemos estar sem viagens, comilanças, festas, compromissos sociais e compras
compulsivas, mas tivemos que chegar a essa situação para saber disso. Viver de
forma mais austera e essencial é um aprendizado valioso para quando voltarmos à
normalidade.
Agradecer o que a vida tem de bom. Ao sermos privados de
tudo aquilo que antes dávamos como certo —por exemplo, passear com amigos ou
reunir com familiares ao redor de uma mesa –, somos conscientes das maravilhas
cotidianas que antes não valorizávamos o suficiente. Anotar todas elas, como
fez Philippe Delerm em The Small Pleasures of Life (Os pequenos prazeres da
vida), é um treinamento para quando possamos sair desta.
Além de cuidar uns dos outros, talvez o mais útil que
podemos fazer ao longo desta paralisação planetária é abrir os olhos e decidir
como queremos viver quando o vendaval passar. Em seu livro As Coisas que Você
Só Vê Quando Desacelera (Sextante), o monge coreano Haemin Sunim diz que há
coisas que podem ser percebidas quando reduzimos o passo e acalmamos a mente.
Pois bem, desaceleramos. Não por vontade própria, mas, já que nos encontramos
nesta situação, vamos aproveitá-la e fazer da necessidade uma virtude, como os
estoicos propunham.
Essa pandemia que sairá nos livros de história fez com que
muitas pessoas percebessem que, na verdade, tampouco gostavam da vida que
levavam antes —ou que ela poderia ser muito melhor.
Se, quando voltarmos à normalidade, pudermos aplicar ao nosso
dia a dia o que estamos aprendendo, este enorme caos terá servido para alguma
coisa.
* Francesc Miralles é escritor e jornalista especializado em
psicologia.
O perigo da “infodemia”
O termo foi cunhado pela Organização Mundial da Saúde (OMS)
para descrever as práticas informativas que promovem o pânico e as condutas
incorretas. Foi utilizado há pouco na argentina por Carla Vizzotti, secretária
de Acesso à Saúde, para advertir jornalistas sobre a importância do rigor na
hora de comunicar a uma população dominada pelo medo. Entre as notícias falsas
que circulam pelas redes sociais e que a própria OMS se encarregou de
desmentir, estão as que dizem que o vírus pode ser morto com um secador de
mãos, tomando um banho quente ou com uma lâmpada de raios UVA. Esta última ação
pode ser inclusive prejudicial para a pele devido ao excesso de radiação.
Tampouco há provas de que os animais domésticos possam contrair o coronavírus,
embora seja aconselhável lavar as mãos após estar com eles. Se ao risco de
contágio somarmos a infodemia, contaminaremos nossa mente com informações
duvidosas ou diretamente falsas.
Texto e imagem reproduzidos do site: brasil.elpais.com
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