Walter Casagrande, ex-jogador e comentarista da Globo.
ALEXANDRE BATTIBUGLI
Publicado originalmente no site Brasil El País, em 15 JUL
2018
Casagrande, o campeão moral da Copa do Mundo
Orgulhoso de sua sobriedade durante a cobertura na Rússia,
comentarista da Globo volta a emocionar com depoimento sobre drogas em rede
nacional
Por Breiller Pires
Mais uma vez, Walter Casagrande não se envergonhou de
compartilhar a luta diária contra a dependência química. O comentarista da
Globo fez um breve e emocionante relato no fim da transmissão que exaltou o
bicampeonato da França. “Essa foi a Copa do Mundo mais importante da minha
vida. Eu tinha a proposta de ir sóbrio, permanecer sóbrio e voltar pra casa
sóbrio. E eu consegui.” A fala levou às lágrimas o companheiro de jornada e
transmissões. Afinal, ninguém melhor que Galvão Bueno para reconhecer a
valentia do enorme ser humano que existe por trás dos atributos de comentarista
e ex-jogador.
Entrevistei Casagrande há sete anos, para a Placar. Algum
tempo antes, ele havia se chateado com a revista, que publicou uma matéria
revelando a batalha que travava com as drogas. Nunca imaginei que uma pessoa
pudesse falar com tanta lucidez e desprendimento sobre um drama que lhe rendeu
várias feridas. Saí de seu apartamento dividido entre o choque e a admiração,
ainda absorvido pelo teor de suas palavras em mais de duas horas de conversa:
“Eu tinha um mecanismo de autodestruição. Queria acabar com a minha vida.
Quando estava sozinho, me achava um bosta. Me afundei, quase morri.”
Na mesma entrevista, ele descreveu o papel determinante que
Galvão Bueno desempenhou ao longo de sua reabilitação, entre avanços e
recaídas. “Meus problemas emocionais eram tão graves que só as drogas me
saciavam. Eu sempre queria mais. O Galvão brigou lá na Globo quando eles tinham
dúvidas se eu poderia ir para a Copa [de 2010], se estaria bem. E ele dizia:
‘Tem que ir, vai ser bom para ele estar lá, do nosso lado’. Galvão foi uma das
pessoas que mais me ajudaram após meu problema e pode contar comigo para o
resto da vida.”
Casagrande tem plena consciência de que não está livre do
vício nas drogas. É um enfrentamento constante, “para o resto da vida”, como
ele costuma frisar nas palestras que ministra pelo país e sempre que aproveita
oportunidades para contar sua história na televisão, a exemplo da série com
médico Drauzio Varella exibida pelo Fantástico. Muito além do comentarista que
não demonstra papas na língua tampouco corporativismo ao criticar jogadores, o
ídolo da torcida corintiana descobriu um novo propósito de vida: quebrar o tabu
sobre a dependência química e mostrar que não há mal algum em reconhecer as
próprias fraquezas, já que o autoconhecimento é a única forma de confrontá-las.
Em um torneio de gratas surpresas, como Bélgica e Croácia, e
de seleções que souberam sair de cabeça erguida mesmo na derrota, Walter
Casagrande deixa a Rússia como o campeão moral da Copa do Mundo. Sua conquista
pessoal é tão tocante quanto o exemplo que deixa para aqueles que lutam
diariamente contra “seus demônios”, tal qual ele descreve em sua biografia. E
também um soco no estômago dos que, desprovidos de sobriedade e caráter, tentam
desqualificá-lo sob o estigma de dependente químico. Que a grandeza de Casão,
em franco e ininterrupto estágio de reconstrução, seja sempre maior que o
desvario dos abutres.
Texto e imagem reproduzidos do site: brasil.elpais.com
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