Equilíbrio e sensibilidade: assim é uma pessoa altamente sensível
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Publicado originalmente no site Brasil El País, em 05/06/2018
Equilíbrio e sensibilidade: assim é uma pessoa altamente
sensível
Entre 15% e 20% da população tem esse perfil. Embora o
rótulo soe estranho, não é nenhum transtorno
Por Jaime Rubio Hancock
Há alguns anos Antonio Alcón se deparou com um artigo sobre
as pessoas altamente sensíveis, com as quais se sentiu identificado, e isso o
motivou a pesquisar mais sobre o assunto. Essas pessoas percebem e administram
mais informações, o que as leva a viver os estímulos de modo mais intenso.
Isso tem vantagens: as Pessoas Altamente Sensíveis (PAS) têm
consciência de detalhes muito sutis em seu entorno. Também são reflexivas,
intuitivas, criativas, empáticas e cuidadosas. Mas essa característica, como
qualquer outra, também têm seus inconvenientes: essas pessoas podem ser muito
precavidas e voltadas demais para seu interior. Às vezes se sentem
sobrecarregadas e exaustas pela intensa atividade ao estarem, por exemplo com
muita gente em ambientes muito barulhentos.
Graças a este processo de busca de informações, Alcón, 38
anos, natural de Jerez (sul da Espanha) e residente em Madri, sentiu
“serenidade”, conta ao EL PAÍS por telefone. “Entendi muitas coisas que se
passavam comigo e aprendi a administrá-las.”
Um traço normal (e frequente)
Embora o rótulo soe estranho, ser altamente sensível não é
nenhum transtorno. E é mais comum do que parece. Como escreve Elaine Aron em
Use a Sensibilidade a Seu Favor – Pessoas Altamente Sensíveis, publicado em
1996, trata-se de algo normal, “uma característica basicamente neutra”. Ente
15% e 20% da população é altamente sensível, em diferentes graus, e outros 22%,
moderadamente sensíveis. (Se você quiser uma orientação sobre se está ou não
neste grupo, pode fazer este teste da própria Aron).
Aron foi a psicóloga que deu nome a esta característica e
que popularizou. (Aliás, seu marido é Arthur Aron, também psicólogo e autor do
experimento das 36 perguntas para se apaixonar).
Apesar de esse traço ser associado com frequência com
outros, como a introversão e a timidez, Manuela Pérez, presidenta da Associação
Espanhola de Profissionais da Alta Sensibilidade, afirma que eles “têm
semelhanças, mas são diferentes entre si”, a ponto de 30% das PAS serem
extrovertidas.
Uma das coisas que de fato essas três características
compartilham é que tendem a ser vistas de forma negativa em nossa sociedade,
como se se tratasse de defeitos. São valorizadas as pessoas extrovertidas,
sociáveis e despreocupadas, o que é muito bom, mas não se vê com tão bons olhos
quem se mostra mais sensível ou precisa de tempo para fica sozinho, atitudes
que costumam ser vistas como se eles tivessem que se “curar”.
Como escreve Aron, “existe essa pressão para fazer o que
todos fazem, para serem normais, manter as aparências, fazer amigos, satisfazer
as expectativas de todos...”, que se nota especialmente na adolescência e
juventude.
Alcón explica que sentiu essa pressão com frequência, já que
vivemos em uma cultura “muito extrovertida. Somos da rua e de nos expor”. Isto
não é nada ruim, mas faz com que as PAS tenham a sensação de “estar indo contra
a corrente porque não gostam do que todo mundo gosta e parece que a cultura não
os aceita. Em resumo, “você não consegue se encaixar, por mais que tente”.
Conhecer os limites
Tudo isso não elimina o fato de que as Pessoas Altamente
Sensíveis têm de aprender mais sobre si mesmas “e aplicar técnicas ou processos
que nos ajudem a conseguir uma melhor adaptação ao entorno ou tirar o melhor
proveito desta característica. Algumas têm a ver com a reformulação de crenças
e outras com o autocuidado, administração de limites ou a comunicação”, comenta
Pérez.
Ou seja, do mesmo modo que uma pessoa muito sociável também
precisa aprender a estar só, uma PAS tem que buscar o ponto médio entre se
forçar demais no mundo exterior (assumindo muitas responsabilidades, por
exemplo) e se manter longe demais no seu interior. Isso significa que às vezes
tem de se protege demais, “quando na realidade o que deseja é estar fora, no
mundo”, como escreve Aron. A psicóloga acrescenta que “talvez o mais difícil de
tudo seja decidir até onde se proteger, até onde se forçar”, sem deixar de
valorizar uma característica que “proporciona muitas coisas de que os demais
carecem”.
Por exemplo, Alcón conta que há sábados em que gosta de
ficar em casa com um livro e outros em que sai com os amigos, mas conhecendo
seus limites: “Talvez eu chegue um pouco mais tarde e saia antes”, conta.
“Trata-se de encontrar o equilíbrio” e favorecer “um entorno de conforto em que
você possa ser você mesmo”.
Outra opção que Alcón tem é se encontrar também com outras
PAS. No início de fevereiro de 2015 organizou a Associação de Alta
Sensibilidade de Madri, com o objetivo de conhecer mais pessoas sensíveis. Fez
uma convocação na página MeetUp para um primeiro café e achava “que apareceriam
três ou quatro”. Vieram 40. “Não sabia onde colocar tanta gente.”
Com esse grupo, explica, foram criados “espaços de
encontro”. Organizam desde cafés temáticos a piqueniques e excursões, que
também convocam em seu grupo do Facebook, que conta com mais de 2000 membros.
Tentam reunir-se em espaços tranquilos, “que nos permitam escutar um ao outro”
e, sobretudo, compartilhar experiências. Não só como PAS, claro: “Temos vivências
e modos de ser muito diferentes”, por isso também há grupos específicos para
famílias, pessoas LGBT+, maiores de 50 anos... Já realizaram mais de 100
encontros. “Ficamos pelo que nos une e compartilhamos o que nos diferencia.”
HOMENS E MULHERES ALTAMENTE SENSÍVEIS
Uma amostra interessante de como a cultura molda nossa visão
sobre a sensibilidade está em um dado que Aron expõe em seu livro: os
porcentuais de homens e mulheres PAS são similares. Mas a psicóloga diz que “a
cultura determina diferenças”, principalmente porque (ainda) meninos e meninas
tendem a ser tratados de forma diferente no que se refere a sua sensibilidade.
No caso dos meninos a tendência é reprimir essa
sensibilidade, enquanto no das meninas ela é potencializada e podem chegar a ser
superprotegidas. Esse preconceito cultural se mantém na idade adulta, escreve
Elaine Aron. De fato, Manuela Pérez, presidenta da Associação Espanhola de
Profissionais da Alta Sensibilidade, explica que em consulta recebe “homens com
evidente dificuldade de mostrar essa sensibilidade ou expressar as emoções
relacionadas com ela, como o choro ou o medo”.
Para Pérez, a visão social da sensibilidade está mudando: “A
cada dia há mostras de como a sensibilidade está sendo vivida e percebida como
uma fortaleza de enorme utilidade”, tanto pessoalmente como no âmbito do
trabalho, onde “estão surgindo novos modelos de liderança focados na empatia e
na colaboração”.
Texto e imagem reproduzidos do site: brasil.elpais.com
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