Publicado originalmente no site do jornal EL PAÍS BRASIL, em
14 de dezembro de 2019
Quer ter sucesso? Últimas notícias sobre a inteligência
emocional
Por Fran Serrato
Triunfar e superar desafios depende não só das habilidades
racionais, mas principalmente das emocionais. Mas elas mal são ensinadas na
escola. As ilhas Canárias foram pioneiras, com uma disciplina obrigatória.
Há 2.400 anos, Platão fez uma fábula para se referir ao
equilíbrio que devemos conseguir na vida. O filósofo grego afirmou que
conduzimos uma carruagem puxada por dois cavalos: um branco, nobre e obediente,
e outro negro, rebelde e descontrolado. Imaginou nossa existência como um
caminho que serpenteia por um penhasco. É imprescindível controlar o corcel
negro para não cair no abismo. A alegoria procura explicar as duas naturezas
que convivem em cada um de nós: a razão e as emoções, que ele apresentou como
instintos perversos dos quais convém fugir.
As emoções nos acompanham desde o início dos tempos e
contribuíram decisivamente para nossa sobrevivência como espécie. Cada uma
delas constitui um impulso que nos leva à ação. Há milhares de anos respondemos
com recursos primários a desafios complexos.
Até algumas décadas atrás, a ciência concordava com Platão.
Acreditava que as pessoas com maior capacidade intelectual eram as mais aptas
para se desenvolver na vida, alcançar o sucesso e a felicidade. A razão
garantia tudo. No entanto, o ser humano é um ser social; precisa dos outros
para crescer. Faz parte de um complexo sistema de interações onde não basta ser
inteligente.
A neuropsicóloga Carmen Sarabia, professora da Universidade
de Cantábria, argumenta que o quociente intelectual não determina o sucesso e
que o quociente socioemocional é muito mais importante. Explica que o cérebro é
melhor projetado para sentir do que para pensar. As conexões neuronais são
ativadas mais por uma emoção do que por um raciocínio. São estruturas
biologicamente arcaicas.
O ser humano também é emoção. Saber disso nos ajuda a
compreender seu comportamento e a justificar suas relações com os outros.
Tradicionalmente, eram consideradas inteligentes as pessoas capazes de
desvendar problemas teóricos complexos. No entanto, usamos o termo
“inteligente” quando alguém é bem-sucedido em terreno hostil, algo que a
inteligência não garante.
Os primeiros a falar de inteligência emocional foram os
psicólogos Peter Salovey e John Mayer no início dos anos 1990, mas foi Daniel
Goleman que popularizou esse termo alguns anos depois. Em sua opinião, o
quociente intelectual representa apenas 20% dos fatores que determinam o
sucesso. Os 80% restantes dependem de outras variáveis, como a classe social, a
sorte e, em grande medida, a inteligência emocional. O mundo empresarial encontrou
nela uma ferramenta para otimizar a produtividade do trabalho.
As equipes de recursos humanos entenderam que os testes de
quociente intelectual não revelavam muito sobre a capacidade de uma pessoa para
desempenhar uma função. Por isso, desenvolveram novas técnicas de seleção.
Agora priorizam a inteligência emocional, que é a que leva um indivíduo a
liderar equipes, a empatizar com o grupo e a motivá-lo. É ela que nos ajuda a
não nos afogarmos em um copo de água e a não nos sentirmos mal se as coisas não
saem como imaginávamos. As habilidades emocionais não só nos tornam mais
humanos, como às vezes são a base para utilizar outras capacidades associadas
ao intelecto.
O ser humano nasce com uma carga genética, mas isso não
significa que o quociente socioemocional não possa ser melhorado. As emoções
podem ser treinadas, assim como a inteligência e a memória, como demonstrou o
experimento de Lászlo Polgár, um professor judeu que estudou as biografias dos
grandes pensadores. Polgár concluiu que havia um alto componente de estudo
desde a infância, então usou essa técnica para transformar suas filhas em
gênios. As três chegaram a ser campeãs de xadrez.
Apesar das recomendações dos especialistas e do fato de que
em 2002 a Unesco lançou uma iniciativa mundial para promovê-la, o aprendizado
emocional ganhou pouco espaço nas escolas. A socióloga Lorena Crusellas o
introduziu há mais de uma década em Portugal e começou a implantá-lo em centros
nas Astúrias, ilhas Canárias e Andaluzia, na Espanha. Ela o aplica em crianças
de três a seis anos de idade, ensinando-as a controlar suas emoções, a
expressá-las e a medir os tempos para fazer isso.
As ilhas Canárias foram a primeira comunidade espanhola a
implantar uma disciplina obrigatória de educação emocional. Desde 2014, as
crianças entre seis e nove anos aprendem durante 90 minutos por semana a
identificar estados de ânimo e reações. Embora ainda não tenha sido avaliado o
impacto dessa matéria nos estudantes do arquipélago, seus benefícios são
conhecidos. Uma análise de 500 estudos constatou que o desempenho acadêmico
melhora 13%.
Crusellas reconhece que dominar a matemática é inútil se não
sabemos como funciona o mundo. Temos de aprender a superar os obstáculos que
surgem diariamente, e para isso não é necessário resolver equações de terceiro
grau nem falar cinco idiomas. Não só.
Fran Serrato é jornalista.
Texto e imagem reproduzidos do site: brasil.elpais.com
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