A baixa pressão da água permitiu com que o furacão Irma
sugasse a água do infralitoral nas Bahamas.
sugasse a água do infralitoral nas Bahamas.
Publicado originalmente no site Huffpost Brasil, em 12/09/2017
OPINIÃO.
O que acontece com a vida marinha quando o mar seca por
conta de um furacão?
Um fenômeno como o que ocorreu nas Bahamas e na Flórida
oferece menos possibilidades de fuga, já que a rota é bastante incerta.
Por Hugo Fernandes-Ferreira
Biólogo, Doutor em Zoologia,
professor universitário e do signo de codorna
O que ocorre com os animais após a passagem de um furacão?
Essa foi uma pergunta recorrente, principalmente após as chocantes cenas do mar
sendo "sugado" pelo furacão Irma na costa das Bahamas na última
semana. O que aconteceu com a fauna marinha daquele lugar?
Eventos como esse são caracterizados como desastres
ambientais naturais, e determinar todas as suas causas e, principalmente,
consequências é uma tarefa praticamente impossível. A complexidade do impacto
de um fenômeno como esse é magnânima, provocando efeitos isolados que se
interconectam, formando, assim, uma reação em cadeia sem chances de ser
completamente rastreada.
Com os animais não seria diferente. Em um evento como o que
aconteceu nas Bahamas, as consequências podem ser completamente distintas a
depender do grupo animal.
A ação mecânica dos ventos de mais de 260 km/h e das ondas
afeta instantaneamente algas, esponjas, cnidários e demais organismos mais
frágeis. Alguns corais levam décadas para cobrir áreas pequenas, e um evento
como esse é capaz de destruí-los em segundos.
A bióloga Erika Santana, especialista em fauna marinha,
afirma que espécies que não se movimentam (sésseis), como alguns corais, podem
aguentar algum tempo expostas ao ar atmosférico. Entretanto, eventos como um
furacão podem mudar profundamente índices físico-químicos importantes, como a
sedimentação flutuante e a salinidade, trazendo impactos de larga escala sobre
esses organismos.
Mesmo para as espécies pelágicas, ou seja, que possuem a
capacidade de natação, furacões também provocam danos graves. O efeito do Irma
na região alcançou centenas de quilômetros, e a maioria absoluta desses
animais, como peixes, moluscos e crustáceos, certamente morreu durante o
desastre.
Paula Honório, doutora em zoologia e professora da Faculdade
Maurício de Nassau, relata que, diferentemente de tsunamis, um furacão oferece
menos possibilidades de fuga, já que a rota é bastante incerta. Na costa da
Flórida e do Caribe, já há diversos registros de morte e encalhe de peixes-boi,
mamíferos marinhos ameaçados de extinção e de movimentação bastante lenta.
Porém, é fato que algumas espécies conseguem perceber a
possibilidade de um desastre com bastante antecedência, como afirma o biólogo
Danilo Rada, especialista em tubarões, animais considerados experts nessa
estratégia.
Pesquisadores da Mote Marine Laboratory (Sarasota, EUA)
descobriram que populações de tubarões galha-preta (Carcharhinus limbatus),
típicos de áreas mais rasas e recifais, migraram para o mar aberto e profundo
assim que a pressão barométrica da água variou minimamente ante passagem do
ciclone extratropical Gabrielle, no Golfo do México, em 2001.
Os tubarões fugiram entre 1h30 a 5h30 antes da passagem do
ciclone. Registros como esse também podem ser encontrados para outras espécies
de tubarões, além de peixes ósseos, como salmão e sardinha.
Porém, dificilmente um grupo animal supera essa capacidade
de percepção dos cetáceos, como relata o Dr. Gustavo Toledo, da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte. Dias antes da passagem do furacão, a ocorrência
de chuvas anormais muda a salinidade da água, e os golfinhos conseguem perceber
essa alteração como um sinal para definir estratégias de fuga para o mar
aberto.
O mais impressionante é que esses animais conseguem
inclusive se beneficiar após a ocorrência de um desastre como esse. Cientistas
da University of the Southern Mississippi notaram que as populações de
golfinhos da espécie Tursiops truncatus aumentaram razoavelmente após o furacão
Katrina, em 2005. Isso porque o evento destruiu boa parte dos barcos pesqueiros
que reduziam as presas desses animais.
Um artigo publicado esta semana pela Scientific American
mostra que o mesmo deve acontecer após Irma e Harvey.
Furacões impactam não só a vida marinha, mas também a
terrestre. Além das incontáveis mortes de milhares de espécies, eles podem
causar sérios danos na estrutura populacional de animais, como nos informa o
primatólogo Dr. João Pedro Souza-Alves, da Universidade Federal de Pernambuco.
Pesquisadores afirmam que o furacão Iris, que atingiu Belize
em 2001, destruiu boa parte da cobertura vegetal da região, diminuindo recursos
alimentares para primatas como o bugio-negro (Alouatta pigra) e provocando uma
redução de 88% de suas populações, além de uma profunda desorganização social.
Além disso, os danos também podem atingir rotas e
alimentação de espécies migratórias, como aves, peixes e baleias; reprodução de
tartarugas marinhas, que desovam no litoral; dispersão de eclosão de ovos e
larvas de invertebrados terrestres e aquáticos e mais uma série incontável de
consequências.
É importante ressaltar que, embora eventos como esse possam
ser considerados como naturais, problemas como o efeito estufa e o aquecimento
global tendem a torná-los cada vez mais frequentes e potencialmente perigosos
para a vida humana e, como vimos, para toda a vida no planeta.
*Este artigo é de autoria de colaboradores ou articulistas
do HuffPost Brasil e não representa ideias ou opiniões do veículo.
Mundialmente, o HuffPost oferece espaço para vozes diversas da esfera pública,
garantindo assim a pluralidade do debate na sociedade.
Texto e imagens reproduzidos do site: huffpostbrasil.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário