(Felipe van Deursen/Creative Commons)
Publicado originalmente no site da revista Super Interessante, em 13 set 2017.
30 mil anos de erotismo na arte
Por Felipe van Deursen
A semana começou quente em Porto Alegre, onde a mostra
“Queermuseu” foi cancelada pelo museu Santander Cultural após reclamações nas
redes sociais de que algumas (três de 264) obras faziam “apologia à pedofilia”.
As críticas se estenderam também ao conteúdo religioso da exposição,
considerado ofensivo por alguns. Aí, depois disso, as redes sociais viraram
palco de calorosos debates de textões sobre os limites e as funções da arte e
do patrocínio à arte.
Assunto velho, tão velho quanto a arte. A voluptuosa Vênus
de Willemdorf, esculpida em calcário entre 28 mil e 25 mil anos atrás, é uma
das primeiras obras artísticas que se tem notícia. A pré-história, aliás, foi prolífica em
imagens assim, que acabaram apelidadas de “deusas da fertilidade”.
Não se sabe se eram mesmo imagens de deusas, ou qual era o
propósito dessas estátuas. Mas o tom erótico está ali, sem dúvida. O fato é que
todas as formas de arte trataram todo tipo de expressão sexual possível. E de
violência, guerra, atrocidades, doenças, maldade, torpor, sangue.
Natural. Se a arte não puder falar do que quiser, não será
arte.
Este blog, então, separou alguns exemplos espalhados no
tempo e no espaço de manifestações culturais que até podem ser chocantes para
alguns, vivos em 2017 ou há milhares de anos, e que estão em alguns dos maiores
e melhores museus do mundo.
(Kim Traynor/Reprodução)
1 – Pompeia
O Museu Arqueológico Nacional de Nápoles, na Itália, tem uma
ala inteira dedicada à arte erótica de Pompeia e Herculano, como se fossem
aquelas alas proibidonas das antigas locadoras de vídeo. Uma das esculturas
mais famosas é Pã Copulando com Bode, que mostra o deus grego dos bosques Pã
fazendo sexo com o bicho com o qual compartilha chifres, orelhas e pernas.
2 – Pênis gigantes do Peru
Considerado um dos melhores museus da América Latina, o
Larco Herrera, em Lima, se dedica a séculos de arte pré-colombiana do Peru. Um
dos destaques é a coleção de cerâmicas de conteúdo sexual.
(Felipe van Deursen/Creative Commons)
(Felipe van Deursen/Creative Commons)
(Katsushika Hokusai/Reprodução)
3 – Tentáculos
O Sonho da Esposa do Pescador, de Katsushika Hokusai, é um
dos exemplos mais conhecidos de shunga, a arte erótica japonesa. A obra, de
1814, traz um eloquente polvo fazendo sexo oral em uma mulher, que ao mesmo
tempo é beijada por um polvo menor.
(Pieter Bruegel, o Velho - Museu do Prado/Reprodução)
4 – Pior (melhor?) que capa de disco de metal
“A carreta dos condenados à morte, cheia de caveiras (…) o cão macilento que mordisca o recém-nascido entre os braços da mãe morta. (…) Uma segunda mulher morta no meio da cena, cavalgada por um esqueleto (…) O morto vestido com um saio dedica-se a cortar a garganta de um peregrino. As cores da carne sanguinolenta e as pilhas de corpos, isto é um levantamento dos modos mais horríveis de morrer”, descreve o escritor Don DeLillo no romance Submundo (1997) sobre a obra-prima O Triunfo da Morte, de Pieter Bruegel, o Velho. Para cada canto que se olhe da obra do holandês (sério, veja numa versão maior), o retrato é a morte da forma mais asquerosa e vil.
“A carreta dos condenados à morte, cheia de caveiras (…) o cão macilento que mordisca o recém-nascido entre os braços da mãe morta. (…) Uma segunda mulher morta no meio da cena, cavalgada por um esqueleto (…) O morto vestido com um saio dedica-se a cortar a garganta de um peregrino. As cores da carne sanguinolenta e as pilhas de corpos, isto é um levantamento dos modos mais horríveis de morrer”, descreve o escritor Don DeLillo no romance Submundo (1997) sobre a obra-prima O Triunfo da Morte, de Pieter Bruegel, o Velho. Para cada canto que se olhe da obra do holandês (sério, veja numa versão maior), o retrato é a morte da forma mais asquerosa e vil.
(Pieter Bruegel, o Velho - Museu do Prado/Reprodução)
Um dos destaques do acervo do Museu do Prado, em Madri, ela
foi pintada no distante 1562. Tão distante que naquele ano os franceses se
matavam por religião (no caso, extremistas católicos massacraram huguenotes) e
os ingleses começaram a fazer fortunas vendendo gente (no caso, o início do
tráfico inglês transatlântico de escravos).
(Caravaggio/Reprodução)
5 – Sanguinolência bíblica
Judite é uma personagem da Bíblia que seduz um general, Holofernes, para degolá-lo e livrar o povo de sua tirania. Enquanto admira o jorro de sangue, vale lembrar que o Antigo Testamento é uma fonte enorme de histórias de extrema violência. Mais de 1,1 milhão de pessoas são assassinadas nos textos sagrados. A relação entre violência e arte nos temas cristãos é tão natural que é raro achar alguém que se choque com a cabeça de São João Batista em uma bandeja ao entrar em uma igreja (até porque o símbolo máximo do cristianismo é um instrumento de tortura e extermínio inventado pelos persas e muito apreciado por romanos e outros povos da Antiguidade).
Judite é uma personagem da Bíblia que seduz um general, Holofernes, para degolá-lo e livrar o povo de sua tirania. Enquanto admira o jorro de sangue, vale lembrar que o Antigo Testamento é uma fonte enorme de histórias de extrema violência. Mais de 1,1 milhão de pessoas são assassinadas nos textos sagrados. A relação entre violência e arte nos temas cristãos é tão natural que é raro achar alguém que se choque com a cabeça de São João Batista em uma bandeja ao entrar em uma igreja (até porque o símbolo máximo do cristianismo é um instrumento de tortura e extermínio inventado pelos persas e muito apreciado por romanos e outros povos da Antiguidade).
Caravaggio concluiu Judite e Holofernes, que está na Galeria
Nacional de Arte Antiga, em Roma, em 1599. A mesma época em que Giordano Bruno
ardeu na fogueira (1600) e que o Parlamento britânico aprovou uma lei que
permitia o transporte forçado de condenados às colônias. Seu nome era o Ato dos
Vagabundos.
Texto e imagens reproduzidos do site: super.abril.com.br/blog/contaoutra
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