Exposição Queer Museu é suspensa após polêmica.
Exposição Queer Museu no Santander Cultural em Porto Alegre (RS) (Reprodução/Facebook).
Publicado originalmente no site da revista Veja, em 12 set 2017.
Veja imagens da exposição cancelada pelo Santander, no RS
Mostra "Queermuseu" foi fechada um mês antes do
previsto depois de protestos de grupos religiosos e do MBL (Movimento Brasil
Livre)
Por Paula Sperb
Cancelada pelo Santander Cultural após críticas de
movimentos religiosos e do Movimento Brasil Livre (MBL), a exposição
“Queermuseu – cartografias da diferença na arte da brasileira” reuniu obras de
85 artistas, incluindo os mundialmente conhecidos Alfredo Volpi e Cândido
Portinari, no museu de Porto Alegre.
Com curadoria de Gaudêncio Fidelis, que foi curador da
Bienal do Mercosul de 2015, a exposição tinha como mote a diversidade e as
questões LGBT, aos moldes de exposições estrangeiras como a Queer British Art (1861-1967), em Londres,
na Inglaterra, e a Hide/Seek: Difference and Desire in American Portraiture, em
Washington, nos Estados Unidos.
Porém a mostra foi cancelada no último domingo, um mês antes
do previsto, depois que os movimentos apontaram que a exposição fazia apologia
à pedofilia e zoofilia. Os movimentos também fizeram campanhas virtuais para
que os correntistas do Banco Santander, que mantém o centro, cancelassem suas
contas como forma de boicote.
Uma das obras que causou revolta foi a que faz referência ao
meme “Criança Viada”, conhecido e apreciado pela comunidade LGBT (imagem
abaixo). ” Isso aqui é praticamente prostituição infantil”, diz um simpatizante
dos movimentos contra a exposição em um vídeo que circula nas redes sociais.
Porém, o significado atribuído pela curadoria é diferente. A obra “Travesti da
lambada e deusa das águas”, de 2013, de autoria de Bia Leite, “desmascara o
preconceito e a homofobia através de uma iconografia da cultura pop”, diz o
curador no texto explicativo do catálogo da mostra.
“Há pouco tinha crianças olhando essa ‘arte’ escarnecendo a
Cristo”, disse o blogueiro Felipe Diehl, durante o vídeo em que ele circula
pela exposição e critica as obras acompanhado de outro blogueiro, Rafinha BK,
do MBL de Porto Alegre. “Olha o Satanás no meio”, diz Rafinha sobre outra obra.
No vídeo, os blogueiros censuram as imagens com um “borrão”. A obra “Cruzando
Jesus Cristo com Deusa Shiva”, de 1996, de Fernando Baril, (abaixo) retrata “as
inúmeras pernas e braços da figura que
reverberam pela superfície da pintura, exibindo objetos de toda ordem nas mãos
e pés, muitos deles relacionados à história da arte e à cultura pop”, explica Fidelis
no catálogo.
Gilberto Schwartsmann, presidente da Fundação Bienal do
Mercosul, o maior evento de arte latino-americana do mundo, disse a VEJA que
lamenta o fechamento da exposição. “Fiquei triste. As pessoas têm o direito de
gostar e de não gostar, de querer e de não querer. Mas precisam respeitar. O
que a gente precisa é de uma lição de tolerância. Entendo todos os lados. As
pessoas não estão preparadas para certas coisas. Isso aconteceu muito na
história. Coisas que nos assustam em 2020, não nos assustam em 2040”, disse
Schwartsmann a VEJA sobre o fechamento .
Outras obras retratavam a prática sexual como a “Cena de
Interior II”, de Adriana Varejão (imagem acima). No caso desta obra, apenas uma
parte dela está sendo divulgada isoladamente como apologia à zoofilia. “Ela
mostra o avanço da pintura brasileira como manifestação crítica diante do
processo de colonização do país. Trata-se de uma pintura que cobre um
considerável território an confluência entre sexualidade e história, revirando
(literalmente) as hierarquias de raça, influências, miscigenação”, explica o
curador Gaudêncio Fidelis em texto do catálogo da obra. “Só tem putaria, só tem
sacanagem” , disse o blogueiro blogueiro Felipe Diehl, no seu vídeo,
queixando-se que as obras são “reconhecidas como arte”.
O prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan Jr. (PSDB)
comentou o fechamento da exposição. Na sua página do Facebook, Marchezan diz
que a mostra tinha “imagens de zoofilia e pedofilia”. Horas mais tarde,
Marchezan apagou sua postagem. Algumas horas depois, o prefeito apagou a
postagem. O prefeito, que é apoiado pelo MBL, obteve liminar na Justiça para
que os protestos contra sua administração fossem proibidos.
Defesa da exposição
Grupos de defesa dos direitos dos LGBT organizam, pela
internet, um ato em apoio em “defesa da cultura e democracia” em frente ao
Santander Cultural para próxima terça-feira, às 16h. Críticos ao
conservadorismo do MBL, os organizadores do ato apontam a contradição de um
suposto movimento liberal atuar pela censura da exposição.
Esta não é a primeira vez que o MBL protagoniza uma polêmica
no Rio Grande do Sul. Recentemente, a Justiça determinou que o blogueiro Arthur
Moledo do Val, do canal Mamãefalei, retire do ar um vídeo em que aborda Luciana
Genro (Psol) e sua família, em Porto Alegre. Caso descumpra a decisão, Do Val
deverá pagar uma multa de 5 mil reais por dia.
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