Agência GETTYA
Publicado originalmente no site do jornal EL PAÍS BRASIL, em 14 de março de 2020
Pandemia de Coronavírus
Medo e ansiedade com a crise do coronavírus? Conselhos dos
psicólogos para tranquilizá-lo
Prestar atenção aos cuidados relacionados à prevenção da
transmissão e tentar manter a calma estão entre os principais fatores, de
acordo com os psicólogos
Diante da incerteza gerada por esse tipo de situação de
emergência sanitária e de reordenamento social, o Colégio de Psicólogos de
Madri divulgou um comunicado nesta semana para ajudar a superar o mal-estar
emocional, oferecendo conselhos para quem tem e para quem não tem relação
direta com o vírus
Se você não foi afetado pela doença
A ansiedade pode se manifestar de várias formas: nervosismo,
agitação, estado de alerta; não conseguir pensar em outra coisa; necessidade de
ver e ouvir constantemente informações sobre o coronavírus; dificuldade para
realizar tarefas diárias. Também é percebida nas pessoas que estão com
problemas para adormecer e que “acham difícil controlar sua preocupação e
perguntam persistentemente aos familiares sobre seu estado de saúde,
alertando-os sobre os graves perigos que correm toda vez que saem de casa”.
Diante dessa situação, o Colégio de Psicólogos propõe:
Identificar pensamentos que possam lhe causar mal-estar.
“Pensar constantemente na doença pode causar o aparecimento ou o aumento de
sintomas que ampliem seu mal-estar emocional.”
Reconhecer nossas emoções e aceitá-las. “Se necessário,
compartilhe sua situação com os mais próximos para encontrar a ajuda e o apoio
necessários.”
Questione: procure provas de realidade e dados confiáveis.
“Conheça os fatos e dados confiáveis oferecidos pelos meios de comunicação
oficiais e científicos e fuja de informações que não provenham dessas fontes,
evitando informações e imagens alarmistas.”
Informe seus entes queridos de maneira realista. “No caso de
menores ou pessoas especialmente vulneráveis, como idosos, não minta para eles
e forneça explicações verdadeiras, adaptadas ao seu nível de compreensão.”
Evite informações em excesso. “Estar permanentemente
conectado não o deixará mais bem informado e poderia aumentar
desnecessariamente sua sensação de risco e nervosismo.”
Comprove a autenticidade das informações que você
compartilha. “Se você usa as redes sociais para se informar, procure fazê-lo
com fontes oficiais.”
Como cuidar de si mesmo nestes casos: os colegiados da
Comunidade de Madri recomendam manter “uma atitude otimista e objetiva”. Evite
falar o tempo todo sobre o assunto, apoie-se na família e nos amigos e ajude a
família e os amigos a manter a calma e um pensamento “adaptativo a cada
situação”, além de tentar levar uma vida normal na qual não se alimente o medo
dos outros.
Se você pertence à população de risco, de acordo com as
autoridades sanitárias
O Colégio de Psicólogos propõe:
Siga as recomendações e medidas de prevenção determinadas
pelas autoridades sanitárias. “Confie nelas porque sabem o que fazer. Têm o
conhecimento e os meios”.
Informe-se de forma realista.
Não trivialize seu risco “para tentar evadir a sensação de
medo ou apreensão com a doença”.
Tampouco o amplifique. Seja cauteloso e prudente sem se
alarmar.
Se lhe recomendarem medidas de isolamento, lembre-se de que
“é um cenário que pode levar você a sentir estresse, ansiedade, solidão,
frustração, tédio e/ou irritação, juntamente com sentimentos de medo e
desespero, cujos efeitos podem durar ou aparecer mesmo depois do confinamento.
Tente se manter ocupado e conectado com seus entes queridos.”
Crie uma rotina diária e aproveite para fazer as coisas que
você gosta, mas que geralmente, por falta de tempo, não pode fazer (ler livros,
assistir filmes, etc.).
Se você está sofrendo da doença
Além de seguir as recomendações acima, os colegiados indicam
vários pontos importantes para o autocuidado:
Administre seus pensamentos intrusivos. “Não se ponha na
pior situação antecipadamente.”
Não se assuste desnecessariamente. “Seja realista. A imensa
maioria das pessoas está se curando.”
Quando sentir medo, conte com a experiência que você tem em
situações semelhantes. “Talvez agora não associe isso por ter uma percepção de
maior gravidade. Pense quantas doenças você superou com sucesso na vida.”
O telefone como foco de ansiedade
“Tenho ansiedade porque todas as conversas, grupos de
WhatsApp, noticiários e timelines das redes sociais (bem, menos o Instagram,
que como sempre faz o que quer) são sobre o mesmo assunto. Não é possível
escapar do circuito em nenhum momento”, explica Lucía Benito, uma barcelonesa
grávida de cinco meses que sofre de mal-estar emocional e físico devido ao
ciclo de informações e ao alarme sanitário do coronovírus. Lucía, como boa
parte da população, trabalha remotamente de casa. “Como grávida, sinto falta de
mais informações específicas sobre como isso nos afeta. Li coisas
contraditórias sobre os efeitos do vírus na gravidez. Tenho um pouco de
taquicardia à noite (embora seja normal tê-la durante a gestação) e é difícil
me concentrar no trabalho”, acrescenta. Lucía não está sozinha. “Não assisto
televisão, mas é impossível me isolar, minha ansiedade disparou”, explica
Cristina González, assistente social de uma prefeitura da província de
Barcelona. O coronavírus invadiu grupos de conversas familiares em que abundam
áudios com boatos sobre supostos transbordamentos nos hospitais. Está em fotos
de supermercados vazios que viralizaram e que ridicularizam certos setores da
população. Também em memes racistas sobre a epidemia, é o protagonista dos
surtos de histeria nas conversas de WhatsApp, onde se especula sobre supostos
fechamentos do espaço aéreo ou de fronteiras sem qualquer confirmação oficial
ou governamental.
Abrir as redes sociais hoje em dia não é uma tarefa fácil,
especialmente para quem tem altos níveis de ansiedade. “Sinto-me exausta, minha
cabeça vai explodir. Estou trabalhando de casa e me conectar às redes ou olhar
para o meu celular gera muitíssima ansiedade”, explica Laura Montes,
trabalhadora do setor de comunicação de 38 anos. Sua situação a inclui na
população de risco. “Pacientes com transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) ou
ansiedade generalizada são população de risco psicológico no momento e estamos
recebendo muitas perguntas sobre a incerteza causada pelo coronavírus. Tanto
para eles quanto para os outros é importante manter a calma, não se alarmar e
seguir as recomendações das autoridades sanitárias”, aconselha a psicóloga
Silvia García Graullera, especialista em transtornos de ansiedade e diretora do
centro PSICIA.
Aprender a reconhecer seus medos
“O medo não é uma emoção ‘ruim’ em si”, esclarece o
psicólogo Rafael García. “O que é ‘ruim’ é que apareça quando não é adaptativo
(em uma situação em que não corremos risco); que não apareça quando seria
adaptativo se ocorresse (em situação de risco) ou que apareça com uma
intensidade tal que nos bloqueia”, alerta antes de analisar a sensação de
mal-estar emocional generalizada pelo alarme sanitário. Uma situação
excepcional em que a disparidade social e de assistência também influenciam.
Não é a mesma coisa enfrentar um chamado à reclusão tendo que cuidar das
crianças e fazer teletrabalho sem nenhum tipo de ajuda do que com a
possibilidade (e dinheiro) de tê-la.
Nossas experiências e traumas do passado também podem
influir de forma problemática nesse período extraordinário. “O fato de termos
vivido situações traumáticas (no caso que nos diz respeito, falaríamos de
doenças próprias ou alheias ou de mortes de entes queridos) pode alterar a
relação que temos com o nosso mundo emocional e, a partir daí, viver o medo,
neste caso, de um lugar inapropriado”, adianta. Para García, o importante é
colocar o medo no contexto que estamos enfrentando no momento. “Para administrar
a ansiedade diante do alarme sanitário, acho que seria importante que cada um
escutasse a mensagem do seu medo. Esse medo seria de se infectar e morrer, de
se infectar e matar, de nossos entes queridos serem infectados, de perdas
financeiras, de isolamento, de estar desabastecido, de rejeição, de não poder
assumir responsabilidades de cuidados...? Seria importante conhecer esse medo:
se é um medo antigo; se é novo ou se você aprendeu com alguém”.
Controlar o consumo de informações (com fontes confiáveis)
Os conselhos de García envolvem contextualizar nossos medos
e tentar acalmá-los com “recursos pessoais que nos regulam emocionalmente” e um
consumo limitado de notícias, colocando o foco nos meios de comunicação
oficiais. “A busca excessiva por informação é uma ação que nos oferece controle
para acalmar o medo, mas paradoxalmente o aumenta, pois alimenta o obsessivo
diante do racional. Fazer uso adequado das informações (especialmente as
provenientes da mídia oficial) e conceder-lhes um espaço mental também adequado
pode nos ajudar a transitar pelas circunstâncias atuais da maneira mais
saudável possível.”
Buscar fontes confiáveis é outra recomendação da psicóloga
Yolanda Cuevas Ayneto. “Devemos limitar a exposição aos meios de comunicação.
As informações nos dão segurança, mas se nos empanturramos, nos confunde e
aumenta a vulnerabilidade. Mas lembre-se, ser vulnerável não anula seus
recursos”, ressalta. A psicóloga, como remédio, aconselha “praticar o
autocuidado” nesse estado excepcional com o autoconhecimento. “Você pode
aprender a acalmar sua mente desses pensamentos de ansiedade antecipatória,
pensamentos alarmistas e pessimistas. Você pode se conectar à sua respiração,
sentir o ar entrando e saindo, seu percurso e toda vez que você cair nesses
pensamentos, volte sua atenção para o nariz, esse lugar por onde o ar entra e
sai. Repetidas vezes, sem se deixar levar pelos juízos. Não se trata de não ter
pensamentos, mas de saber acompanhá-los e soltar”.
Texto e imagem reproduzidos do site: brasil.elpais.com
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