Foto: Reprodução/Internet
Publicado originalmente no site RADAR SERGIPE, em 7 de agosto de 2023
Barbie o filme: quebra de preconceito e empoderamento feminino
Por Luiz Eduardo Oliva
Essa não é uma crítica de cinema, embora eu seja de uma geração de cinéfilos que para além de cultuar o cinema ainda ousava tanto a crítica cinematográfica nos jornais (Ivan Valença, Clóvis Barbosa, Djaldino Mota Moreno) como fazer filmes: éramos a geração do Super 8 mm que era uma forma de fazer cinema amador a partir dos idos dos anos 60 quando Glauber Rocha, o mais prestigiado cineasta brasileiro, dizia que para fazer cinema bastava “uma idéia na cabeça e uma câmara na mão”.
Pois bem, levado por minha filha Eduarda fui ver meio desconfiado o filme do momento: Barbie. Fui com a cabeça de quem cultua a sétima arte a partir do filme de arte e entorta o nariz para filmes como, por exemplo, a Barbie. Fui, todavia, de rosa. Ao sair do filme, entre surpreso e extasiado, fui até a Caixa da Barbie, em frente ao cinema, e não só me fiz fotografar com a família como postei nas redes sociais me chamando de Ken, o personagem masculino da boneca Barbie. Logo recebi de um amigo querido, culto, amante do cinema de arte, uma reprimenda pelo Whatsapp: “Cuidado ‘homi´ com suas inserções na mídia virtual. Ainda envolve a família!! Você está sendo alvo de gozações”. Lembrei Carlos Drummond o maior poeta do seu tempo que disse que adorava ver os “Trapalhões”, uma heresia para o mundo intelectual na época. Depois da fala dele a maioria se revelou fã dos Trapalhões e muitos deixaram de assistir às escondidas.
Inegavelmente achei que o filme seria mais um produto do cinema estadunidense para vender. Imaginei logo a Barbie loira, num mundo fora da realidade, e excludente. No entanto, minha filha que na infância brincou muito com a boneca (tem até hoje algumas, também a casa da Barbie e o boneco Ken) é hoje estudante de jornalismo e tem posições firmes da liberdade feminina, da importância da luta feminista, da necessidade de combater a absurda diferença de gênero que ainda insiste nos dias atuais junto à persistência ainda da cultura patriarcal. Mas a Barbie para ela não representa apenas a sua boneca predileta da infância e adolescência. Me disse: meu pai, você vai se surpreender, a Barbie é uma mostra da mulher atual.
O filme é inegavelmente delicioso, divertido, cheio de humor ferino mas alegre e um deleite para qualquer idade. Já, de cara, na entrada, o rosa tomava conta das pessoas. Havia uma euforia no ar. E eu me senti dentro dela. Não é um filme bobo, nada, absolutamente nada que levasse à tal das “gozações” de que falou meu amigo. No final, aliás, me senti orgulhosamente o Ken que está consciente da realidade mundo real das mulheres cada vez mais vencendo o patriarcado que estupidamente ainda insiste em resistir. O filme – e os cinéfilos de antanho vão perceber isso, inclusive o meu amigo resistente – já inicia com uma remissão a um dos melhores filmes dos anos 1960: “2001, uma odisséia no espaço” de um dos gênios do cinema, Stanley Kubrick quando uma menina no mundo pré-histórico da Barbie quebra uma boneca ao som de “Assim Falou Zaratustra” o poema sinfônico do compositor alemão Richard Strauss, baseado na obra do filósofo Nietzsche para fazer surgir a famosa boneca.
O filme disparou na internet e foi o assunto que ficou em primeiro lugar no Twitter no dia do lançamento. Gerou artigos altamente favoráveis de críticas como Isabela Boscov, uma das principais articulistas do jornalismo de cinema no Brasil. Me fez retornar à infância da minha filha: lá estavam a casa da Barbie, o carro, a piscina e, o melhor, todas as Barbies que superando a primeira exclusivamente loira disse: a mulher pode tudo e a Barbie pode ser todas, não somente aquela magra, loira, esbelta, mas qualquer uma com qualquer cor, com qualquer corpo, com qualquer profissão.
O filme, aliás, não faz concessão sequer à Mattel, a empresa estadunidense que fabrica a boneca (no filme a sátira é para um staff corporativo só de homens) nem para sua criadora Ruth Handler que foi condenada por fraude fiscal mas depois, diagnosticada com câncer de mama, aderiu às campanhas de conscientização da mulher. O elenco é primoroso, ponto sobretudo para a atriz Margot Robbie que, beirando à perfeição (minha mãe dizia, seguindo os passos de Santo Agostinho, que perfeição só em Deus) faz a boneca Barbie e cabe destacar a excelente direção Greta Gerwig (Adoráveis Mulheres e Lady Bird).
O filme veio não para tratar da história de uma boneca, mais que isso, para quebrar paradigmas. Sugiro o filme às pessoas que ainda não assistiram, inclusive o meu amigo da reprimenda. E de preferência que vão de rosa, dentro do espírito do filme. Não cabe mais no mundo atual a idéia de que meninas usam rosa e meninos usam azul. Meninos como eu, já sexagenário, usam rosa também. Para que todos os preconceitos sejam quebrados, inclusive aqueles que pensam que quem cultua o intelecto não pode usar rosa, nem assistir ao filme da Barbie e muito menos postar-se nas redes sociais vestido de Ken, como eu fiz, dentro de uma caixa de bonecas.
Texto e imagem reproduzidos do site: radarsergipe com br
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