Crédito: Jeffrey Markowitz
Publicado originalmente no site da revista ISTOÉ, em 01/03/19
Lorena Bobbitt sem cortes
A jovem que emasculou o marido em 1993 revela segredos do
escândalo e se declara feminista em quatro documentários
Por Luís Antônio Giron
ONTEM E HOJE No alto, Lorena Bobbitt em setembro de 1993, no
julgamento
por mutilação do marido, John Wayne Bobbitt;
aqui, Lorena Gallo em
2019, defensora dos direitos da mulher
Crédito:Jeffrey Markowitz
Ela realizou o sonho de muitas mulheres e o mais temido
pesadelo ancestral masculino. Na madrugada de 23 junho de 1993, em Manassas,
Virgínia, cidade-dormitório de Washington D.C., a manicure equatoriana Lorena
Leonor Bobbitt esperou que o marido, o ex-fuzileiro naval desempregado John
Wayne Bobbitt, dormisse para lhe decepar o pênis com uma faca de cozinha.
Aquilo que podia parecer o ato final de uma tragédia deu a
deixa para piadas e gargalhadas e para a exacerbação sensacionalista de
revistas e canais de televisão. O gesto terrível empolgou o planeta nos últimos
anos antes da supremacia da internet, fez a fama do casal e injetou doses
inéditas de escândalo na cultura das celebridades. A ponto de, no ápice da
superexposição midiática, Lorena e John terem sido tragados por casos que se
seguiriam. A série documental “Lorena”, em quatro episódios, disponível no
serviço de streaming Amazon Prime Video, retorna à cena da emasculação para
revelar detalhes que passaram despercebidos na época.
Um das peculiaridades do “incidente Bobbitt” diz respeito à
condição dos dois protagonistas. Quem mereceria o título de herói e vilão da
história? Seria Lorena vítima dos abusos repetidos de John ou ele teria sofrido
a mutliação porque a esposa se recusava a cumprir “deveres” matrimoniais? O
documentário, produzido por Jordan Peele (diretor do terror “Corra!”, de 2017),
coloca Lorena, hoje Gallo, em posição de responder. É ela quem conduz a
narrativa, ao passo que John e outros integrantes ficam com os depoimentos
menores —sem trocadilhos.
Jeffrey Markowitz
CASAMENTO O fuzileiro John Wayne e a imigrante Lorena se casam em 18/6/1989:
crise matrimonial gerou agressões (Crédito:Divulgação)
Caça ao pênis
Submetida a julgamento, Lorena foi absolvida, sob a
justificativa de que cometeu o gesto levada por “impulso irresistível” após
tentar inutilmente obter prazer do marido. O casal virou alvo da imprensa.
Emissoras de rádio e TV cobriam ao vivo as longas sessões de tribunal. “Foi um
circo”, diz Lorena, que não contém as risadas ao se recordar do que viveu.
“Todos queriam um pedaço de mim.” Sem trocadilhos. Por isso, contratou um
agente para atender a pedidos, incluindo uma proposta de US$ 1,3 milhão para
posar nua para a revista “Playboy”. “Minha formação religiosa me impediu de
aceitar o convite”, diz. John também foi inocentado, pois ele convenceu os
jurados de que Lorena havia premeditado o corte ao deixá-lo excitado enquanto
dormia. “Ela ficou mexendo em mim até que sonhei que Freddy Krueger tinha
atravessado a parede para me pegar”, lembra. Anos depois, foi condenado por
estupro — segundo ele, por pressão de grupos feministas.
Longe da vida pública, John se esforça até hoje em se
valorizar. Lembra que, numa façanha inédita, seu pênis foi resgatado pela
polícia em um terreno baldio, onde Lorena o havia jogado, e reinplantado com
sucesso. “A única maneira de provar que a cirurgia tinha dado certo era fazer
filmes pornôs”, afirma. Estrelou dois: “John Wayne Bobbitt: Uncut” e “John
Wayne Bobbitt’s Frankenpenis”. Lançados em 1996, tornaram-se blockbusters do
gênero.
Se John se afastou das câmeras, Lorena reformatou a vida.
Casou-se há 20 anos com o empresário Dave Bellinger. O casal tem uma filha,
Olivia, de 16 anos. Em 2007, ela criou a Lorena’s Red Wagon, fundação dedicada
à prevenção da violência doméstica. Tornou-se apoiadora de Hilary Clinton (John,
de Trump) e uma das fundadoras do movimento #MeToo contra o assédio sexual de
mulheres. Em um evento beneficente em 2018, ela foi apresentada como a
personalidade que realizou o sonho americano da redenção. “Desculpe, mas não
sou celebridade”, discursou. “Sou uma ativista.”
Texto e imagens reproduzidos do site: istoe.com.br
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