Publicado originalmente no site El País Brasil, em 13 de outubro de 2018
Os três ingredientes da receita do amor
Por Inmaculada Ruiz
Intimidade, paixão e compromisso são os três elementos que
compõem o amor conjugal. De sua combinação surgem diferentes tipos de relação.
Será mais sólida a que contiver todos os três, e menos a que se basear em
apenas um deles.
“O amor é um intenso anseio (desejo e necessidade) de união
com o outro.” Assim começa o curso Anatomia do Amor, ministrado anualmente na
Faculdade de Psicologia da Universidade Autônoma de Madri. “O amor, e não o sexo
como se acredita, é o autêntico mecanismo de sobrevivência da espécie: as crias
morreriam sem o cuidado conjunto do pai e da mãe durante seus primeiros anos de
vida”, afirma Manuel de Juan Espinosa, o catedrático de Psicologia que dirige o
curso, para explicar que esse sublime sentimento é a força mais potente que
move o mundo.
O argumento de Espinosa não difere muito do que, talvez com
mais cinismo, sustentava Schopenhauer em sua Metafísica do Amor Sexual, em que
o filósofo deu um rumo biologicista à filosofia ao afirmar que o amor não era
senão um álibi do sexo para perpetuar a espécie. Dois séculos depois daquele
escândalo, os cientistas já não questionam a teoria psicobiológica do amor, que
se desdobra em três fases equivalentes ao ciclo reprodutivo:
- O desejo: A atração sexual, a libido. É o que nos faz
escolher um parceiro e não outro, em função de parâmetros meramente físicos,
relacionados com preferências genéticas e critérios reprodutivos.
- A paixão amorosa: É o momento da união física do casal,
quando a relação se consuma e se mantém. Seu fundamento biológico é a
procriação.
- O apego: É o sentimento profundo em relação ao companheiro
de longo prazo, que responde à necessidade de criação, sem o qual a
sobrevivência da prole estaria em risco.
O fato de a estrutura do amor estar associada a sua origem
reprodutiva não impede que se repita da mesma maneira entre pessoas de qualquer
idade, seja fértil ou não; dá-se igualmente com independência da vontade de
procriar e da opção sexual dos membros do casal.
O amor pode começar em qualquer dessas fases. Cada uma está
guiada por redes cerebrais diferentes, com químicas distintas, que geram
comportamentos variados (condutas, esperanças, sonhos…), mas todos com um mesmo
fim: a consumação sexual imprescindível para a sobrevivência da espécie.
Os três ingredientes
da receita do amor
Paralelamente a esta classificação das fases baseada em
critérios biológicos, a maioria dos estudos atuais sobre a psicologia desse
sentimento se baseia na teoria triangular do amor, elaborada pelo psicólogo
Robert Sternberg. Segundo esse professor da Universidade de Yale, o amor
conjugal se compõe de três elementos:
- A intimidade, que compreende os sentimentos de conexão, vínculo
afetivo e, especialmente, a autorrevelação, que em psicologia significa revelar
ao outro certos aspectos íntimos de si mesmo.
- A paixão, que supõe o desejo intenso de união sexual ou
romântica com o outro.
- O compromisso, que supõe a decisão de amar a outra pessoa
e a promessa de manter esse sentimento vivo.
Da combinação destes três pilares surgem diferentes tipos de
amor. Será mais sólido o que contiver todos os três, e menos os amores baseados
em apenas um deles. A paixão seria o mais básico e frágil, isso que chamamos de
“amor à primeira vista”, que surge de um encantamento amoroso sem intimidade
nem compromisso. No “amor romântico” existe uma união sentimental e passional,
mas ele carece de compromisso: é o típico amor de verão.
A relação ideal é o amor consumado, o único que contém os
três elementos. É a relação perseguida por todos, mas a mais difícil de obter
e, sobretudo, de manter ao longo do tempo: é quase impossível se não houver um
compromisso dos membros do casal de manter as três engrenagens bem azeitadas.
Conservar a admiração mútua, manifestar o afeto com frequência, preservar o
respeito, cuidar da própria imagem, manter espaços próprios, cultivar
afinidades e aceitar o outro como ele é são algumas das chaves para que a
relação amorosa seja satisfatória e duradoura.
A paixão, provocada por uma tormenta hormonal, seria
preocupante se não fosse um estado transitório
A paixão amorosa da primeira teoria é o tempo fisiológico
que corresponde ao amor romântico da segunda: é o momento tórrido da relação,
quando a sexualidade está mais presente. É isso que chamam de paixão. Esse
estado é transitório: segundo os especialistas, dura aproximadamente um ano.
Para Freud, caso se prolongasse por muitos anos deveria ser considerado um amor
patológico.
O psicólogo Walter Riso, especialista em relações amorosas,
afirma que “a paixão parece beirar a patologia e, às vezes, não é outra coisa
senão uma obsessão exacerbada”. Em seu livro Guía Práctica para Superar la
Dependencia Emocional: 13 Pasos para Amar com Independencia y Libertad (inédito
no Brasil) enumera as atitudes mais frequentes na paixão:
- Idealização do outro. Exclusividade (só o seu parceiro
desperta seu interesse sexual). Apego (pensar que nada faz sentido sem o
outro). Ilusão de permanência (acreditar que esse amor é único). Pensamentos
obsessivos (a mente estará a serviço da outra pessoa). Senso de fusão (sensação
de serem almas gêmeas). Riscos irracionais (a conduta se torna compulsiva).
Essa loucura, provocada por uma tormenta hormonal que se
retroalimenta, seria preocupante se não fosse um estado transitório. Em um ano
no máximo acabará. Com sorte, e com uma dose equilibrada de intimidade,
compromisso e paixão, se transformará no cobiçado amor consumado.
Texto e imagem reproduzidos do site: brasil.elpais.com
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