Publicado originalmente no Portal UOL, em 10/01/2018
Vida de "cam girl": "Meu primeiro orgasmo foi
na frente da câmera"
Gween Black tem 24 anos e há quatro trabalha exclusivamente
como "cam girl"; o tédio da época da faculdade a levou até a
atividade...
Por Natacha Cortêz
Do UOL
Exibir o corpo na internet para um espectador desconhecido
em troca de dinheiro é profissão e alimenta uma indústria bilionária, que só em
2016 lucrou aproximadamente 3 bilhões de dólares.
"Cam girls" (mulheres câmera, em tradução livre do
inglês) são as protagonistas desse mercado, que tem no sexo seu principal
combustível. Na prática, uma "cam girl" tem a tarefa de instigar
desejo e gozo, além de levar descontração e relaxamento para quem a assiste.
“Nem sempre a audiência está atrás de orgasmos. Às vezes, a pessoa quer apenas
esquecer do dia de merda que teve”, conta A.*, 23, que há dez meses reserva
suas madrugadas para entreter voyeurs.
LiveJasmin, a maior plataforma para "cam girls" do
mundo, recebe entre 35 e 40 milhões de visitantes por dia e tem cerca de 2.000
pessoas se exibindo. Ali não são apenas mulheres que estão atrás da câmera.
Existem homens, casais, duplas, trios e até grupos. E há todo tipo de gente.
Padrão não é necessariamente algo bom para os negócios quando o assunto é
fetiche. “As pessoas gozam com as coisas mais doidas que você pode imaginar.
Tem cliente que sente tesão sendo humilhado por ter pau pequeno”, conta Queen Lagertha,
"cam girl" desde 2015.
Ouvimos cinco brasileiras que trabalham como "cam
girls" em sites dedicados aos stripteases caseiros. Elas contam o que as
levaram a despir o corpo na internet, entregam os pedidos mais inusitados da
audiência e o que aprenderam sobre si mesmas depois que entraram para a
atividade.
“Tinha cliente que sentia tesão sendo humilhado por ter pau
pequeno”
“Sou fotógrafa e musicista. Moro no Canadá desde 2015 e no
início, quando meu visto não me permitia trabalhar, era cam girl em tempo
integral. Isso durou um ano e meio, pelo menos. Tinha mil bloqueios em relação
à sexualidade por ter sido criada em uma sociedade machista e cheia de
julgamento. Eu me libertei disso quando passei a exercer a atividade. Gosto de
fetiche, mas foi só quando me livrei das minhas próprias barreiras que pude
realmente usufruir, de forma natural. Comecei por dinheiro, com certeza.
Poderia ter feito outras coisas para ganhar uma grana, mas escolhi sexo porque
gosto de sexo. Quando você trabalha com isso, precisa entender das coisas. Fui
estudar. Estava completamente fascinada. De repente, tinha de atender clientes
que sentiam tesão sendo humilhados por terem pau pequeno. Teve ainda um moço
que me pediu para colocar um episódio do Pato Donald no YouTube, enquanto eu
fingia ser a bruxa má da história. Nos períodos que mais trabalhei, tirava uns
500 dólares a cada 15 dias.” (Queen Lagertha, 32 anos)
O universo dos strips caseiros que movimenta bilhões
“Meu primeiro orgasmo foi na frente de uma câmera”
“Tinha 20 anos quando decidi ser uma cam girl. Umas amigas
já eram, e isso tornou minha entrada mais fácil. Não fui atrás de dinheiro,
queria era experimentar algo novo. Minha sexualidade sempre foi muito
reprimida, tinha problemas de autoimagem e fazia um tempo que enfrentava a
bulimia. Minha ideia era estar ali para me sentir mais bonita. E foi o que
aconteceu. Não sou nenhuma modelo, pelo contrário: sou mais gordinha, tenho
estria, celulite e nenhuma bunda. Pode parecer loucura me jogar logo no mundo
do sexo, tão cheio de preconceitos. Mas o que vi ali, sendo uma cam girl, é que
só chega em você quem gosta de você. Isso tem me protegido. Tanto que meu
primeiro orgasmo foi na frente de uma câmera, para uma audiência de 20 pessoas.
Eu me masturbava em cima da minha cama quando rolou. Penso que ser uma cam girl
é uma atividade que transcende a pornografia, é mais que vender o corpo, é se
entender melhor.” (M., 22 anos)
Ser uma cam girl é uma atividade que transcende a
pornografia, é mais que vender o corpo, é se entender melhor.
“Faço 300 dólares por final de semana”
“Tem dois anos que trabalho como cam girl. Na verdade, é meu
segundo trabalho, que só faço às sextas, sábados e domingos. Durante a semana,
sou fotógrafa. Comecei a ser cam girl para pagar um intercâmbio. O dinheiro
veio relativamente fácil e me empolguei. Hoje, em um final de semana de muitas
horas on-line, faço 300 dólares. De forma geral, os clientes que atendo
procuram satisfazer seus fetiches. Existe homem hétero que gosta de se vestir
de mulher e colocar a lingerie da parceira. Para mim, ser uma cam girl nunca
foi só sobre satisfazer o prazer do outro, mas sobre entender mais do meu
corpo, dos meus desejos. É uma experiência que julgo só minha e por isso
ninguém da minha família sabe.” (G., 31 anos)
“Nunca soube que era criativa até entrar nesse mundo”
“Comecei a ser ou cam girl em 2013, aos 19 anos. Foi a
depressão e o tédio da época da faculdade de direito que me levaram à
atividade. Nunca soube que era uma pessoa criativa até entrar nesse mundo. Sou
cam girl em tempo integral. Trabalho para várias plataformas, mas nenhuma com
contrato exclusivo. Sou em quem decide minha rotina, assim como outras cam
girls. Meus espectadores são americanos, mas a média de idade varia. Tem homens
de 18 e de 80 anos. Tem gente que me assiste com a mulher, tem quem assiste
para só beber junto e ouvir música. Não sou hipersexual na frente da câmera,
sou mais uma amiga. Meus shows são muito divertidos e terminam em masturbação
às vezes, mas não é esse o foco. Meus pais aceitam minha profissão. Mas não é a
regra, muitos abandonam suas filhas por escolherem essa atividade. Ser cam girl
me permitiu conhecer meu corpo, a sexualidade humana e quebrar tabus. Venci a
depressão e ajudei outras pessoas com problemas parecidos com os meus. Não sou
terapeuta e nenhuma cam girl é, mas conheço muitas que se interessaram pela
psicologia no caminho.” (Gween Black, 24 anos)
Ser cam girl me
permitiu conhecer meu corpo, a sexualidade humana e quebrar tabus.
“Mostrar o corpo na internet reforçou minha autoestima”
“Ser cam girl e atriz pornô seria a mesma coisa?
Particularmente, acho que não. No pornô, você está presa em um sistema
exploratório. Como cam girl, tenho autonomia de fazer o que quiser com o meu
corpo, a hora que quiser. Sou eu quem decide estar ali. É uma escolha e, no meu
caso, muito consciente. Se me masturbo, é porque quero. Se não quero mostrar o
rosto --o que é regra para mim--, não mostro. Faz uns seis meses que passei a
tirar a roupa para desconhecidos. Meu motivo? Diria que é um misto de prazer e
diversão. É um jeito de explorar minhas fantasias, brincar com a minha
sexualidade. Por fim, acredito que mostrar o corpo na internet reforçou minha
autoestima. Dinheiro não importa por enquanto, até porque passo poucas horas
por semana na frente da câmera. A comissão que acabo ganhando é ínfima. No mês
passado, deu um pouco mais de cem dólares.” (B., 27 anos).
Texto e imagem reproduzidos do site: estilo.uol.com.br
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