Foto: Revista Conhecimento Prático – Literatura Ed. 52.
Hábitos de leitura no Brasil
Publicado originalmente no site da revista Literatura, em 13 de fevereiro de
2017
Por Sérgio Simka* | Adaptação web Caroline Svitras
Controvérsias à parte, é inegável que atualmente Mário
Sérgio Cortella (1954) faça parte do panteão dos grandes formadores de opinião
do Brasil. Suas intervenções na Rádio CBN, são não só verdadeiras aulas de
Filosofia, como também de ética, de cidadania e de educação em seu sentido
lato. Seu maior trunfo – ter resgatado a importância da Filosofia como base da
arte do bem viver e do conviver e torná-la acessível a todos. Sem dúvida, é
devido à influência de Cortella que hoje vários jovens debruçam-se sobre os
ensinamentos de Sócrates, Platão, Aristóteles – os pais da Filosofia ocidental
-, e de tantos outros filósofos.
Natural de Londrina, o filósofo e escritor, com mestrado e
doutorado em Educação pela PUC-SP, teve o privilégio de ter como orientador de
sua tese de doutorado – defendida em 1997 e que originou o livro A Escola e o
Conhecimento (Cortez, 2008) -, nosso Patrono da Educação, o pernambucano Paulo
Freire, com quem conviveu por 17 anos, desde que o autor da Pedagogia do
Oprimido voltou do exílio, em novembro de 1979, até maio de 1997, quando
morreu.
Com sua verve contundente, Cortella costuma dizer que,
quanto à educação pública, o Brasil saiu da UTI nas últimas décadas, passou
para a enfermaria, mas ainda não teve alta.
O filósofo e educador é um mestre do incitar, levando-nos a
abandonar nossa “zona de conforto” intelectual. Arguto desafiador, suas
provocações filosóficas nos deixam inquietos e, sobretudo, colocam em xeque
nossa própria existência.
Leia o que ele nos transmite no livro Qual é a Tua Obra?
(Vozes): “O desejo por espiritualidade é um sinal de descontentamento muito
grande com o rumo que muitas situações estão tomando e, por isso, é uma grande
queixa. E a espiritualidade vem à tona quando você precisa refletir sobre si mesmo;
aliás, a espiritualidade é precedida pela angústia.”
Ou este petardo, do mesmo livro: “Por que um bombeiro, que
não ganha muito e trabalha de uma maneira contínua em algo que a maioria de nós
não gostaria de fazer, volta para casa cansado, mas de cabeça erguida? Por causa do sentido que
ele vê no que faz. Por causa da obra honesta, a serviço do outro,
independentemente do status desse outro, da origem social, da etnia, da
escolaridade etc.”
Essa sua consideração acima não nos faz realmente “pôr as
barbas de molho” e parar para pensar? Portanto é com imenso prazer que partilho
com vocês a entrevista que o Professor e Doutor Mário Sérgio Cortella me
concedeu em maio de 2013, a qual foi publicada em primeira mão no Portal Mauá e
Região, um informativo online do qual sou
colunista.
SS: VOCÊ ESCREVEU DEZENAS DE LIVROS. QUAL O LIVRO QUE LHE
DEU MAIS SATISFAÇÃO? (TANTO PELO FATO DE TER ESCRITO COMO PELA RECEPÇÃO DO
PÚBLICO)
MSC: O livro A Escola e o Conhecimento, por ser resultante
de minha tese de doutorado, orientada por Paulo Freire, e a ele dedicado, é o
que mais me encanta como autor; o livro, porém, com melhor recepção, lançado
faz quatro anos e já na vigésima edição (com mais de 200.000 exemplares
vendidos) é o Qual é a tua Obra? (Inquietações Propositivas sobre Gestão,
Liderança e Ética).
SS: COMO TEVE A INSPIRAÇÃO PARA ESCREVÊ- LOS? ALIÁS,
ACREDITA EM INSPIRAÇÃO?
MSC: Se entendemos inspiração como sendo um “sopro”
momentâneo e casual que nos atinge, não acredito nela; porém, se a entendemos
como sendo fruto da atenção persistente e intencional nas várias situações que
nos provocam no cotidiano e que nos desafiam a traduzir em palavras e
reflexões, aí nela creio. Cada um dos meus livros resultou de inquietações
diversas, seja endogenamente, seja por alguma solicitação externa; tenho o
hábito de anotar ideias para textos ou livros quando sou atiçado por alguma
circunstância e, parte delas, depois ganha corpo literário.
SS: PARA VOCÊ, O QUE SIGNIFICA SER ESCRITOR?
MSC: Sou, antes de tudo, professor, por escolha e prazer na
partilha; por isso, meu “corpo docente” encontra várias maneiras de se
comunicar, sendo que uma delas é exatamente a escrita de livros e artigos. Ser
escritor é acolher a capacidade de transbordar para além de minha reclusão
mental e estabelecer pontes comunicacionais.
SS: COMO ANALISA A QUESTÃO DA LEITURA NO PAÍS?
MSC: A partir dos anos 1970 houve uma diminuição da leitura,
especialmente pelo uso intenso de tecnologias de contato que priorizavam a voz
e a audição; porém, desde os anos 2000 estamos retomando o crescimento de
leitores, pois as redes sociais se dão especialmente pela escrita e leitura
(FaceBook, Twitter etc.), e quem precisa e quer escrever, acaba por ler mais,
para poder fazê-lo melhor e com mais conteúdo. Essa é a razão pela qual a
plataforma “livro” teve crescimento de consumo entre crianças e jovens no
último triênio, sem concorrer banalmente com plataformas “digitais”.
SS: UMA MENSAGEM AOS QUE DESEJAM SE LANÇAR NO MUNDO
EDITORIAL.
MSC: Começar no universo da própria comunidade, escrevendo e
divulgando entre amigos e conhecidos para que se capture o nível de relevância;
se houver boa ressonância, procurar inserir em blog na Web e verificar o
interesse e retorno. Após, havendo sucesso, procurar editora, sugerindo que
visitem o blog para primeira avaliação. O restante é fruto da persistência e
dos contatos.
SS: VOCÊ RECEBEU INFLUÊNCIA DE ALGUÉM PARA SE DEDICAR A
ESCREVER?
MSC: Como professor, comecei a carreira universitária aos 21
anos, dando aulas em algumas instituições; no mundo acadêmico a escrita de
textos, pesquisas, artigos e livros é exigência intrínseca, o que me colocou
nesse caminho também como tarefa; o prazer, no entanto, veio e vem da minha
imensa fruição como leitor, sem que haja alguém exclusivo que me tenha
influenciado no estilo, mas, isso sim, como é o caso de Paulo Freire, nas
ideias.
* * *
E por que não fecharmos nossa entrevista com Cortella, com
as declarações de figuras influentes nas mais diversas áreas?
“Trazer uma figura da importância do Professor Cortella a
Santo André para debater educação, cultura e outros assuntos, além de ser um
enorme prazer, é fundamental para que possamos qualificar as pessoas, trazer
informações e desenvolver o conhecimento. Ele foi muito feliz nos temas
abordados e enriqueceu muito, todos os participantes, que lotaram o clube
Primeiro de Maio. Foi muito bom e importantíssimo para nossa cidade ter o
professor Cortella conosco nesta noite.” (Raimundo Taraskevicius Salles,
secretário de Cultura e Turismo de Santo André-SP, sobre a palestra que
Cortella ministrou no município em setembro de 2013).
“O Professor Mário Sérgio Cortella tem um invejável
histórico na área da Educação. Foi orientando em seu doutorado do elogiadíssimo
Paulo Freire, na PUC de São Paulo. Dotado de voz teatral, encanta ouvintes com
sua entonação bastante marcada. Ao lado da erudição, tem aquilo que muitas
vezes limita os intelectuais, a magia da sedução de seu discurso.
Não raro aborda temas em que coloca a Filosofia ao lado do
cotidiano: o amor, o trânsito, a falta de senso crítico das pessoas, por
exemplo. Em outras palavras, consegue empatia com o público como o fazia (ainda
faz, mas menos agora) o professor Pasquale com as suas inquietantes e
irresistíveis aulas de Português.
Na rádio, em entradas diárias, em entrevistas, na internet,
enfim, o professor Cortella faz sucesso. Traz a academia um pouquinho mais
próxima das pessoas. É possível que traga também um certo incômodo a
professores pouco afeitos à exposição pública. Em tempos de informação
“midiatizada”, as críticas soam ultrapassadas.
“É isso!”, como diria o professor Pasquale.” (Roseli
Gimenes, coordenadora do curso de Letras da UNIP)
“Creio que a maior contribuição do professor Mario Sergio
Cortella à sociedade foi tirar a Filosofia dos livros acadêmicos e inseri-la no
cotidiano, para ser discutida à luz do sol. Suas aulas, palestras ou
considerações mostram que os conceitos filosóficos não são abstrações chatas,
mas ensinamentos importantes que contribuem para que se leve a vida com mais
responsabilidade e menos preocupações.” (Sérgio Vieira, diretor de Redação do
jornal Diário do Grande ABC)
“A Filosofia é aquela que permite a reflexão sobre a vida,
sobre o mundo, sobre o homem, sempre na esperança de oferecer métodos de
percepção das coisas que existem. Vivemos em um mundo repleto de mistérios, a
própria existência é um enigma para nós e para sair desse processo angustiante
temos a oportunidade de pensar sobre tudo que nos rodeia, o papel do filósofo é
construir um espaço para o entendimento, para a observação e análise de desta
experiência existencial, o professor Mario Sergio Cortella faz isso, nos
permite o mergulho no mundo das ideias, dos conceitos e nos coloca frente a
muitos pensamentos. Assim abrimos nossos horizontes e quebramos as correntes da
ignorância.” (Marco Antonio Palermo Moretto, filósofo, pós-doutor em Ciências
da Religião pela PUC-SP, autor do livro Ser professor reflexivo não é um
bicho-de-sete-cabeças)
Bibliografia de Mário Sérgio Cortella
Entre as diversas obras publicadas por Cortella, merecem
destaque: a Escola e o Conhecimento (Cortez), Nos Labirintos da Moral, com Yves
de La Taille (Papirus), Não Espere Pelo Epitáfio: Provocações Filosóficas
(Vozes), Não Nascemos Prontos! (Vozes), Sobre a Esperança: Diálogo, com Frei
Betto (Papirus), O que é a Pergunta?, com Silmara Casadei (Cortez), Liderança
em Foco, com Eugênio Mussak (Papirus), Filosofia e Ensino Médio: certas razões,
alguns senões, uma proposta (Vozes), Viver em Paz para Morrer em Paz: Paixão,
Sentido e Felicidade (Versar/Saraiva), Política: Para Não Ser Idiota, com
Renato Janine Ribeiro (Papirus), Vida e Carreira: um equilíbrio possível?, com
Pedro Mandelli (Papirus), Educação e Esperança: sete reflexões breves para
recusar o biocídio (PoliSaber), Escola e Preconceito: Docência, Discência e
Decência, com Janete Leão Ferraz (Ática), Não Se Desespere! (Vozes) e Qual é a
tua Obra? Inquietações Propositivas sobre Gestão, Liderança e Ética (Vozes).
*Sérgio Simka, mestre e doutorando em Língua Portuguesa pela
PUC-SP, é escritor, fundador e coordenador do Núcleo de Escritores das
Faculdades Integradas de Ribeirão Pires (FIRP). Criou e coordena para a Editora
Ciência Moderna a série Não é um bicho-de-sete-cabeças, livros voltados a uma
nova maneira de enxergar temas contemporâneos.
Adaptado do texto “Mário Sérgio Cortella”
Texto e imagem reproduzidos do site: literatura.uol.com.br
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