Cena do filme 'Tempos modernos', de Charles Chaplin (Divulgação).
Publicado originalmente no site da revista CULT, em 20 de junho de 2017.
Trabalhadores digitais, uni-vos
Por Marcia Tiburi
A promessa histórica das tecnologias foi a libertação do
trabalho.
Penso nessa engambelação sempre que vejo um caixa
eletrônico, uma bomba de gasolina sem frentista, um caixa de supermercado ou de
farmácia em que o atendimento é essa coisa esquisita chamada de “self-service”.
Sempre que, do outro lado da linha, uma gravação telefônica
usurpa o lugar de um ser humano, eu me incomodo. Ainda prefiro pessoas ocupando
esses lugares.
Hoje em dia, enquanto o hábito de falar ao telefone
desaparece com as novas redes sociais, empresas de telemarketing usam robôs
para ligar para possíveis clientes. Qualquer um que passe uma tarde em casa
recebe até telefonema de funerária tentando vender túmulos. Talvez estejam
falando de morto para morto.
Aquele que antes trabalhava, agora dorme na rua sem teto,
justamente porque não tem como pagar esse artigo de luxo que se torna um lugar
para morar nas grandes cidades.
Os direitos trabalhistas são ameaçados enquanto o próprio
trabalho desaparece.
Nessa horas em que trabalhar está em baixa, muitos ficam
horas e horas na frente do computador como se não estivessem fazendo nada.
Depois das promessas das tecnologias essa é uma nova
engambelação. Pois o regime de entretenimento é, na verdade, o novo regime de
trabalho. Adeus CLT, adeus jornada de trabalho de 40 horas, adeus hora-extra,
adeus carteira assinada, adeus FGTS, para que tudo isso quando se tem um perfil
nas redes sociais?
Calma, o nexo, já surgirá na sua tela…
É verdade que uma nova produtividade digital se instaurou.
Fazemos muitas coisas pela internet: nos comunicamos como nunca, ficamos
sabendo de tudo, compramos de tudo um pouco.
Sobretudo, trabalhamos de graça produzindo textos e mais
textos, fotos e mais fotos, transmitindo informação como carteiros sem patrão.
Concentrados, atentos e dedicados, somos todos funcionários
dóceis das redes sociais tentando levar nossa vantagem na era da iniciativa
privada e do empreendedorismo, incapazes de reivindicar direitos, até porque
eles não existem mais. Foram apagados junto com o trabalho. E ninguém mais
precisa falar disso.
Consumidores de Facebook e outras redes sociais são
trabalhadores digitais. Não apertam mais parafusos como no filme de Chaplin,
agora eles teclam e teclam. A esmolinha pelo trabalho não remunerado é um
“like”, uma “curtida” que se ganha de vez em quando, conforme o capital social
adquirido nas redes.
Alguém vai chamar isso de pós-trabalho. Um nome mais
simpático do que a velha exploração.
O usuário das redes é o novo otário, mas não se deve dizer
isso, afinal, a hipocrisia é a lógica triunfal desse processo. O lucro final
que resta partilhar na firma universal da internet.
Texto e imagem reproduzidos do site: revistacult.uol.com.br
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