'Infantilização da política' está em curso no mundo todo, diz Marina
Publicado originalmente no site BBC Portuguese, em 7 maio 2018
Brasil não vai mudar com ‘grande pai, grande mãe, ou
salvador da pátria’, diz Marina Silva
Nathalia Passarinho, Fernanda Odilla e Luís Barrucho
Da BBC Brasil em Londres
A ex-senadora Marina Silva, pré-candidata à Presidência da
República pela Rede, afirmou neste domingo (6), na Universidade de Oxford, que
há um movimento de "infantilização" da política em diversos países do
mundo, pelo qual os eleitores buscam "salvadores da pátria" para
solucionar crises políticas e econômicas. Para ela, a busca por este tipo de
liderança não trará renovação e mudanças ao Brasil.
"O mundo em crise vai precisar do trabalho de sujeitos
capazes de se responsabilizar pelas próprias vidas. O problema é tentar
regredir para um processo infantil", criticou, durante palestra no Brazil
Forum UK, evento anual organizado por brasileiros que estudam no Reino Unido.
'Como defender meritocracia quando Brasil é o país que menos
taxa herança?', diz discípulo de Piketty
"Em vários lugares do mundo estamos regredindo. As
pessoas querendo o grande pai, a grande mãe, o grande salvador da pátria. O
mundo não vai mudar com uma politica que infantiliza".
Em uma fala de 45 minutos, Marina Silva elencou as
principais conquistas dos partidos tradicionais ao dizer que o que deu certo
deve ser transformado em "direito", enquanto é preciso corrigir
erros.
'O PT não vai tirar o Lula, nem oferecer outro candidato',
diz Dilma em Londres
Ela lembrou que o MDB foi um partido importante na luta pela
democracia, destacou que o PSDB estabilizou a economia com o Plano Real, e que
o PT reduziu a desigualdade social e a pobreza com o Bolsa Família.
"Temos que pensar de uma forma não niilista. Com
certeza queremos preservar a democracia, não queremos ter crise econômica, nem
iniquidade social", afirmou ela, ao defender menos radicalidade e polarização
nos posicionamentos políticos.
Ela disse ter saudade da eleição presidencial de 2010,
quando os oponentes eram capazes de se cumprimentar com respeito.
'Biblioteca de processos parados' vai atingir candidatos nas
eleições, diz jurista da FGV-Rio
Marqueteiro 'do mal'
Durante a participação na conferência, Marina Silva foi
perguntada sobre que lições ela tira de duas derrotas como candidata à
Presidência (em 2010 e em 2014). Ela afirmou que um erro foi "subestimar
as estruturas que dominam o poder".
A ex-senadora disse que a eleição de 2014 foi uma
"fraude". Para ela, a campanha eleitoral da ex-presidente Dilma
Rousseff (PT) daquele ano manipulou informações para desconstruir sua
candidatura.
"Em 2010, eu participei do processo e foi uma eleição
razoavelmente civilizada. Mas em 2014 ultrapassamos o limite da ética. Se você
ganha mentindo, vai governar mentindo; se ganha com violência vai governar com
violência", afirmou.
Marina Silva lembrou que tinha em sua equipe de campanha a
socióloga Neca Setubal, herdeira do banco Itaú, e que isso foi usado contra ela
pela campanha de Dilma.
Na ocasião, Marina Silva foi acusada de defender os
interesses de "banqueiros".
"Isso graças a um marqueteiro, o João Santana, muito
competente para o mal, com R$ 30 milhões de caixa dois", criticou.
'Brasil tem sociedade viciada em Estado', diz ministro
Barroso, do STF
"Não pode uma pessoa ganhar com o discurso do
marqueteiro e não fazer nada daquilo (que prometeu)."
Questionada sobre como iria governar sem alianças
partidárias que garantam votos no Congresso Nacional, ela respondeu alfinetando
Dilma Rousseff.
"Quando você pergunta como vou governar com três
deputados e um senador, você tem que perguntar para quem tinha mais de 300 e
não governou."
Nas duas eleições presidenciais que disputou, Marina
terminou em 3º lugar
Mudanças estruturais
Marina Silva também defendeu mudanças estruturais no sistema
eleitoral como necessárias para uma renovação real da política. Uma das
prioridades, segundo ela, deveria ser o barateamento das campanhas.
"Não tem como ser politicamente democrático quando a
gente substitui projeto de país por projeto de poder, onde compromissos são
pragmáticos e não programáticos, e o que vale é tempo de televisão e
dinheiro."
Ela também defendeu a diversificação da economia e
investimentos em logística e infraestrutura.
"Não tem como o Brasil ser economicamente próspero com
uma indústria que representa 11% do PIB quando já foi 25%. Quando a gente perde
30% da produção agrícola por falta de logística e armazenamento."
Chapa com Joaquim Barbosa
Depois do evento, a pré-candidata disse a jornalistas que
vai usar os 10 segundos que terá na TV e no rádio para remeter aos programas e
propostas, que estarão disponíveis na internet.
Ela negou ter conversado com o ex-presidente do Supremo
Tribunal Federal e recém filiado ao PSB, Joaquim Barbosa, sobre uma potencial
chapa com os dois.
"Eu respeito a decisão dele de querer ser candidato, do
PSB querer ter uma candidatura; é legítimo. Isso não impede que a gente tenha
pontos de contato, de diálogo, partidariamente falando", afirmou, dizendo
que com Barbosa falou apenas duas vezes na vida.
Marina disse que está se coligando com vários movimentos
como o Agora, Acredito, Brasil 21, Frente Favela. "Eu antecipei a
tendência quando disse, em 2010, que a aliança era com os núcleos vivos da
sociedade. Sempre defendi a quebra do monopólio dos partidos, com candidaturas
avulsas."
Alianças pragmáticas e sem compromisso ideológico levaram o
país para o buraco, diz Marina
Quem vai vencer as eleições
Questionada sobre as conversas sobre uma possível união
política do presidente Michel Temer com o ex-governador de São Paulo, Geraldo
Alckmin, ela diz que foi esse tipo de aliança que levou o Brasil ao fundo do
poço.
"Agora as pessoas sabem a verdade e a lei deve ser para
todos. A preocupação é o que as pessoas vão fazer com a verdade. Essa é uma
questão que está posta: se o que vai vencer é a postura do cidadão ou as
estruturas do dinheiro, do marqueteiro, do tempo de televisão".
Para Marina Silva, as alianças feitas pelos partidos
tradicionais não são capazes de resolver os problemas do Brasil.
"Não acredito que a visão e as práticas que criaram o
problema vão resolver o problema, pelo contrário. Principalmente os grandes
partidos que estão aliançados para acabar com a Lava Jato. PT, PMDB, PSDB, DEM
divergem em quem vai pegar o poder, mas não divergem (em relação) ao combate à
Lava Jato", disse, em Oxford.
Texto e imagem reproduzidos do site: bbc.com/portuguese
Nenhum comentário:
Postar um comentário