sábado, 22 de março de 2025

Cérebros apodrecidos

 Henry David Thoreau

Artigo compartilhado do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 21 de março de 2025

Cérebros apodrecidos

Se a sua vida se resume basicamente a introjetar, sem piedade, toneladas de lixo na sua mente, ela passará a viver disso. Dennis Xavier para a Crusoé:

“Cérebro apodrecido” (brain rot, em inglês) foi eleito o termo do ano pelo dicionário de Oxford.

A expressão se refere a uma sensação, conhecida de muitos de nós, que deriva de consumo excessivo de conteúdos triviais, simplórios e banais que inundam especialmente as redes sociais: aquela constatação incômoda de que o cérebro vai se dissolvendo em meio a tantas bobagens e notícias ruins.

Bem, ainda não há comprovação científica de que o cérebro realmente “apodreça” ao consumir o chorume do mundo virtual.

Mas os estudos estão apenas no início e não devem tardar em evidenciar aquela intuição que quase todos nós temos e que ficou impressa num dito estoico: se você frequenta um limpador de chaminés, fatalmente sairá sujo de fuligem.

É o óbvio ululante!

Diga-me no que prestas atenção e te direi quem és!

Se a sua vida se resume basicamente a introjetar, sem piedade, toneladas de lixo no cérebro, ele passará a viver disso, a se alimentar disso e a reproduzir ideias e comportamentos a altura.

Estamos caminhando perigosamente para uma sociedade ancorada em indivíduos que não conseguem concatenar pensamentos mais complexos, que demandem conexões causais não óbvias e que, em suma, não conseguem lidar com problemas não triviais.

É o império da platitude e da ignorância sistêmica.

Henry David Thoreau, primeiro a escrever sobre apodrecimento cerebral, abordou a questão um bom tempo antes da internet e de seus efeitos potencialmente catastróficos.

Em seu livro Walden ou A vida nos Bosques, de 1854, ele criticou a tendência da sociedade em desvalorizar ideias complexas em favor das mais simples.

“Enquanto a Inglaterra se esforça para curar a praga da batata, não haverá nenhum esforço para curar a praga do cérebro — que prevalece muito mais ampla e fortemente”, escreveu Thoreau.

Mais recentemente, em 1953, Ray Bradbury – autor da clássica distopia Fahrenheit 451 – toca a questão da superficialidade de uma vida cercada por telas que emitem nada mais do que, eu diria, conteúdos misológicos, anti-intelectuais: gente que toma um livro de qualidade por ameaça, que passa toda uma vida dedicada a obscenidades intelectivas de baixo nível em telas espalhadas por todos os lados.

Assustadoramente atual…a sociedade disfuncional descrita no livro de Bradbury é exatamente a que estamos construindo para nós, segundo demanda nossa!

Apenas reverendíssimos apedeutas agem assim diante de seus próprios destinos.

Ainda em 1960, o autor relatou:

“Escrevendo ‘Fahrenheit 451’, eu pensei que estava descrevendo um mundo que talvez ‘aconteceria’ em quatro ou cinco décadas. Mas, há algumas semanas, numa noite em Beverly Hills, um casal passou por mim caminhando com seu cachorro. Eu fiquei olhando para eles, absolutamente pasmo. A mulher segurava, em uma mão, um rádio, em forma e tamanho mais ou menos de um pacote de cigarro, com uma antena balançando. Dele, saía um minúsculo cabo de cobre que terminava em um delicado fone em forma de cone ligado na sua orelha direita. E ela ia 'voando', sonâmbula, esquecida do homem e do cão, escutando à novela que tocava no rádio, guiada por seu marido que provavelmente não estava nem aí. Isso não era ficção”.

Com o advento dos smartphones, quem nunca, não é mesmo?

Não bastasse tudo, a rolagem excessiva de feeds de redes sociais pode levar a níveis mais elevados de sofrimento psicológico e níveis mais baixos de bem-estar mental, como apontou pesquisa da National Library of Medicine.

Logo, meus amigos… não é que devamos arremessar nossas telas no fogo. Mas precisamos de menos tempo com elas diante dos olhos e de maior qualidade no que frequentamos. Isso, claro, se não quisermos ver nossos cérebros “apodrecer”.

Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com

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