Post de Artigo compartilhado do Facebook/Antonio Samarone, de 15 de julho de 2023
Loucos de todo o gênero.
Por Antonio Samarone*
Jesus percorria a Galileia. “Lhe traziam os que eram acometidos de doenças diversas e atormentados por enfermidades, bem como os endemoninhados, lunáticos e paralíticos.” Mat. 4:23-5.
A loucura é anterior ao Homo sapiens. Foram encontrados sinais, no homem de Neandertal. A medicina também é anterior ao Sapiens. Fósseis com o fêmur remendado, são sinais de cuidados com os ferimentos dos outros.
Nenhum animal resiste a uma perna quebrada. Ele morre! Ou por não conseguir chegar a uma fonte de água, ou por tornar-se presa fácil para os predadores.
A psicopatologia existe desde que os hominídeos desenvolveram o lobo frontal do cérebro, a fonte dos sofrimentos. O medo da morte é antigo.
Voltando aos loucos.
O Código Civil brasileiro de 1916, em seu artigo 5º, definia como incapazes, entre outros, “os loucos de todo o gênero”.
Quem eram os esses loucos? Os doidos, malucos, lunáticos, insanos, lelés, lesos, aluados, idiotas, ruins da bola, maníacos, dementes, tresloucados, psicopatas, psicóticos, destrambelhados, pinel, birutas, alienados, retardados, abilolados ou maníacos. A denominação era diversa.
As sociedades agrícolas simpatizavam com os seus doidos. A minha mãe tinha uma profunda compaixão por eles: “não existem doidos no inferno, todos se salvam, dizia ela.” Eu enxergava nisso um grande atrativo: ser livre do fogo eterno.
Sempre gostei dos doidos!
As sociedades rurais conviviam com os seus doidos, mesmo sem trabalhar, improdutivos. Desde que eles não ameacem a segurança.
Todas as comunidades possuíam os seus insanos. Zé Doidinho, em Itabaiana, era estimado por todos.
O capitalismo nunca precisou dos improdutivos. A incapacidade para o trabalho era inaceitável, passível de punição. A vadiagem era crime. A saída foi trancafiá-los em grandes manicômios.
A sociedade pôs moderna precisa dos neuróticos, mas teme os psicóticos.
Quem são hoje esses loucos, na pós-modernidade, para a psiquiatria? As doenças mentais não possuem materialidade. São doenças definidas pela palavra.
De forma genérica, temos três grupos:
Os psicóticos que deliram e alucinam. Doentes graves. Os remédios reduzem as alucinações e os delírios, contudo, não ajudam na ressocialização. Esses pacientes causam medo a sociedade..
A esquizofrenia, quando acompanhada da pobreza, causa grande sofrimento. É num problema social.
“Alucinações e delírios são vivencias distorcidas, que envolvem todas as funções psíquicas – percepção, representação, juízo crítico, volição, afetividade e memória. Nada fica de fora.” – Ali Ramadam.
O fanatismo e o delírio são irmãos. O negacionista acredita, sem reservas, em um sistema de ideias, ancorado apenas em sua cosmovisão. Não admitem contestação. O fanático é obcecado por suas ideias. O delirante é um fanático em seu modo de pensar.
Existe um segundo grupo: os grandes deprimidos. Tolerados, desde que continuem produtivos. A sociedade os vê com grande desconfiança. Muitas vezes subestimam o seu sofrimento. Desconfiam. Suspeitam de simulação.
Os remédios são muitas vezes eficazes contra os sintomas. Os fármacos, além dos efeitos colaterais, causam dependência. Nesse grupo, é elevada a prevalência dos burnouts e dos suicidas.
E um terceiro grupo, o mais numeroso, dos que padecem de sofrimento mental leve. Angústia, sofrimento existencial. Precisam de ajuda para levarem a vida.
São pessoas atormentadas, que não toleram o sofrimento. Enxergam a felicidade como um direito, mesmo quando a natureza nunca os tenha prometido.
O mal-estar, estudado por Freud, foi medicalizado. Uma saída química, prevista por ele.
A Sociedade do Cansaço, no dizer de Chul-Han, criou uma legião de atormentados, que a psiquiatria ateórica americana chama de transtornos. Criaram mais de mil categorias diagnósticas, numa fragmentação absurda, bem ocupada pela indústria farmacêutica.
Os fármacos são da mesma família dos venenos e dos tóxicos.
As drogas psiquiátricas são eficazes na redução ou eliminação passageira da ansiedade e do mal-estar. Com um detalhe, os fármacos também são eficazes em pessoas sem queixas de sofrimento mental.
Os normais se tornam mais normais, com o doping. Mais competitivos, com o raciocínio mais rápido e com a memória estendida.
Os novos medicamentos psiquiátricos reduziram os efeitos colaterais e a dependência. Podem ser usados, sem que os usuários demonstrem qualquer alteração visível.
Em breve, os editais dos concursos vão exigir teste anti-doping.
* Antonio Samarone – médico sanitarista.
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> Comentário: Clara Angelica Porto
Acho, Samarone, que essa questão é por demais complexa. Existem pessoas que sofrem de transtornos mentais como depressão clinica, transtorno bipolar, e até certos tipos de esquizofrenia que, com tratamento psiquiátrico e terapêutico, com medicamentos eficazes hoje existentes, podem ter uma vida normal. Muitas dessas pessoas têm inteligência bem acima do padrão normal, e são excelentes profissionais em suas áreas. Muitas não podem parar de tomar os remédios, porque sofrem crises fortes, muitas vezes psicóticas. Nos Estados Unidos, grande parte dos moradores de rua têm problemas mentais sem tratamento, ou sofrem de algum tipo de adicção. Muitos portadores de transtornos mentais recusam tratamento. A questão é complexa e delicada. Conheço pessoalmente casos de pessoas diagnosticadas com graves transtornos mentais que, através de tratamentos adequados, não somente levam uma vida normal, mas têm sucesso e destaque profissional. Einstein era disléxico; James Taylor é bipolar; Ray Charles era toxicômano e se recuperou. Entre as grandes inteligências de pessoas que acrescentam muito ao mundo, encontramos, com muita frequência, portadores de um ou outro transtorno mental. Parece-me que o tema lhe fascina. A mim também. A complexidade da mente humana é um dos mergulhos mais profundos que existem. Gosto quando você aborda o tema. “Se for louco ou for poeta, pode entrar, seja bem-vindo.”
> Resposta: Antonio Samarone > Concordo...
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Artigo, imagem e comentários reproduzidos do Facebook/Antonio Samarone.
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