Roda gigante abandonada (e nunca usada) de Pripiat é o grande símbolo do desastre de Chernobyl, que em 1986 esvaziou uma cidade inteira.
Publicado originalmente no site do jornal El País Brasil, em 18 ABR 2019
Da hecatombe nuclear à ilha abandonada: o poder de fascínio
das cidades-fantasma
Há 33 anos escutamos falar pela primeira vez de um lugar
chamado Chernobyl.
Hoje é um território desabitado, que, com outros exemplos,
inspiram medo e intrigam
Por Guillermo Alonso
Poucas coisas provocam mais fascínio do que os lugares que
foram construídos para as pessoas, mas onde não há pessoas. Edifícios
abandonados, estruturas enferrujadas e ruas que antes eram lotadas hoje
reconquistadas pela vegetação, são um poderoso símbolo da passagem do tempo, da
nossa futilidade como espécie e também uma imagem impactante do que poderia ser
um mundo no qual o ser humano não exista mais.
São conhecidas como cidades-fantasmas. Mas o que é
exatamente uma cidade-fantasma? São, por exemplo, as ruínas de Pompeia? Não
exatamente: um lugar desse tipo nos impacta mais quanto mais se parecer com as
cidades que conhecemos. Os restos de pedra de um povoado antigo nos parecerão
bonitos, mas observar um prédio como o que nós mesmos podemos ocupar ainda com
os objetos das pessoas que viviam ali, e que reconhecemos como cotidianos, nos
conduz a uma cena familiar e, portanto, muito mais chocante.
Muitas vezes esses lugares são museus de um momento recente
da história: seus cartazes, placas de sinalização e templos ficaram congelados
no tempo. Outra razão pela qual uma cidade-fantasma nos assombra é porque no
momento é o mais parecida que conhecemos com uma viagem no tempo.
As cidades-fantasmas são inspiração para a ficção, um
negócio milionário de agências de turismo em todo o mundo e uma fonte de
inspiração para documentários e livros. Quando se completam 33 anos da tragédia
de Chernobyl (que resultou na maior e mais famosa cidade-fantasma do mundo)
repassamos alguns dos casos mais espetaculares. Aliás, na Espanha tivemos uma
cidade-fantasma resultante do estouro da bolha imobiliária: a cidade de Seseña,
projetada por Paco el Pocero, deserta durante anos. Mas hoje há listas de
espera para ir morar lá. Estes outros casos que analisamos não tiveram o mesmo
destino.
Pripyat, a cidade que Chernobyl esvaziou para sempre
Em Pripyat a natureza reconquistou a cidade.
Onde fica? No norte da Ucrânia, quase na fronteira com
Belarus.
Pode ser visitada? Sim, há excursões guiadas saindo de Kiev
quase todos os dias, que incluem protocolos de segurança na entrada e na saída.
A famosa roda gigante de Chernobyl, que não foi inaugurada e
hoje
continua a ser um poderoso símbolo do desastre.
O que aconteceu? Pripyat era uma cidade de cerca de 50.000
habitantes, onde viviam principalmente os trabalhadores da usina nuclear de
Chernobyl e suas famílias. Uma cidade moderna para os parâmetros da União
Soviética, que incluía cinemas, bibliotecas e até mesmo um pequeno parque de
diversões prestes a ser inaugurado quando ocorreu o acidente da central
nuclear, na noite de 26 de abril de 1986. A explosão do reator 4 forçou a
retirada de toda a população da cidade por causa do risco de radiação, em
princípio durante alguns dias. Dezenas de milhares de moradores de Pripyat e
das aldeias vizinhas que saíram nunca puderam voltar.
Panorâmica Pripyat depois do desastre em 1986. Ainda não
tinha o aspecto
fantasmagórico que aparenta no momento. Fotos: Getty Images
Como é hoje? Luis Lobo é um dos turistas espanhóis que
visitaram o que é conhecido como a "zona de exclusão".
"Contratamos uma excursão em Kiev", diz ele. "A agência se
encarregou da papelada com os militares para atravessar o acesso. Minha
primeira sensação foi de espanto: esperava algum sinal dos estragos da
radiação, como solo estéril ou ausência de animais. Em vez disso, o que havia
era a natureza em estado puro abrindo caminho e reconquistando espaços que
antes eram vilas, casas ou escolas. Passeando pelo interior de casas, escolas e
outros edifícios era como percorrer uma fotografia do momento em que foram
abandonados. Para onde quer que você olhasse, podia ver uma história. Pudemos
chegar perto do perímetro da usina, fazer uma selfie macabra e nos espantar com
o tamanho descomunal do novo sarcófago que estava sendo construído a poucos
metros [uma estrutura gigantesca que tentará evitar novos vazamentos de
radiação]. De volta a Kiev, tivemos de passar de novo por outro controle
militar. Desta vez havia uma máquina para dar um alerta e impedir a saída caso
alguém estivesse contaminado.”
Há alguns moradores que, apesar das advertências das
autoridades, decidiram não abandonar suas casas dentro da zona de exclusão.
Atualmente, calcula-se que cerca de 150 pessoas vivam nessa área. Outros
trabalhadores ainda fazem serviços de manutenção na central, mas sempre
controlando seu tempo para não ficarem expostos a níveis de radiação muito
altos.
Onde vi isso? Prípyat inspirou desde livros
chocantes como Vozes de Tchernóbil, da vencedora do prêmio Nobel Svetlana
Aleksiévitch, a filmes de terror como Chernobyl.
Texto e imagens reproduzidos do site: brasil.elpais.com
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