IMPACTO Woodward (Redford) e Bernstein (Hoffman) no cinema.
Os homens que derrubaram um presidente (Foto: Collection Christophel).
Como o jornalismo muda o mundo
João Gabriel de Lima - Diretor de Redação.
Bob Woodward e Carl Bernstein estão para o jornalismo do
século passado como Lionel Messi e Cristiano Ronaldo para o futebol atual. São
os símbolos máximos de excelência na profissão que escolheram. Após uma
investigação acurada, os dois repórteres desvendaram o caso Watergate – em que
agentes do FBI e da CIA espionaram a sede do Partido Democrata, pouco antes da
reeleição do republicano Richard Nixon para a Presidência dos Estados Unidos. A
história serviu de base para o filme clássico Todos os homens do presidente, de
1976, em que os dois jornalistas são magistralmente interpretados por Robert
Redford e Dustin Hoffman. Nixon, um dos políticos mais resilientes da história
americana, foi obrigado a renunciar depois da série de reportagens de Woodward
e Bernstein. O caso Watergate é o exemplo mais eloquente do impacto do
jornalismo na sociedade.
Repórteres não mudam o mundo apenas quando derrubam
presidentes da República. A missão essencial do jornalismo é elevar o nível do
debate público – e, assim, a atividade interfere decisivamente no rumo das
democracias (jornalismo e democracia, aliás, são palavras inseparáveis. Uma não
existe sem a outra). Tal missão é cada vez mais importante no mundo atual. O
jornalismo eleva o nível do debate público quando agrega fatos concretos às
grandes discussões, evitando que a paixão desinformada leve à polarização sem
sentido, como acontece frequentemente em nossa era de redes sociais. Quando
emite opiniões a partir de apuração – momento em que se torna uma voz no
debate. Ou quando publica opiniões divergentes sobre assuntos momentosos –
momento em que se torna a própria arena do debate. O jornalismo eleva o nível
do debate público, sobretudo, quando publica informações inéditas, furos de
reportagem como o de Woodward e Bernstein. Dados novos e desconhecidos
frequentemente mudam o rumo das discussões em um país.
A redação de ÉPOCA decidiu usar a edição em que comemora seu
milésimo número para mostrar como o jornalismo interfere na realidade. A
revista se compõe de reportagens sobre reportagens. A ideia era avaliar o
impacto de algumas das principais matérias publicadas pela revista desde o
número 1, lançado em 1998. A recente entrevista exclusiva com Joesley Batista,
por exemplo, trouxe um novo entendimento sobre o capitalismo de compadrio
brasileiro – e balançou os alicerces da política brasiliense. É o impacto de um
furo de reportagem. ÉPOCA também foi a primeira publicação brasileira a
discutir de forma madura o uso recreativo de drogas, na reportagem em que a
apresentadora Soninha admitiu que fumava maconha, publicada em 2001. De maneira
análoga, a capa que estampa o casal de militares gays Laci de Araújo Marinho e
Fernando Alcântara, publicada em 2008, foi o mote para o primeiro evento
governamental sobre direitos homossexuais – até então, o tema era evitado pelos
políticos.
O impacto do jornalismo se multiplica na era digital. Uma
reportagem – em texto, vídeo ou podcast – pode repercutir em milhões de novos
textos, vídeos ou podcasts. O outro lado da moeda é que uma notícia falsa pode
obter a mesma difusão. Na era da pós-verdade, cabe ao jornalismo, sobretudo,
estabelecer a base de fatos sobre os quais se assentam as grandes discussões
nacionais. Nunca é demais repetir: é com fatos aferidos e checados que o
jornalismo eleva o nível do debate público. É com fatos aferidos e checados que
o jornalismo estabelece o próprio chão da democracia.
Texto e imagem reproduzidos do site: epoca.globo.com
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