Qual a fonte primária do crescimento econômico?
A paciência. De onde veio a paciência? Dos livros.
Publicado originalmente no site cartacapital, em 15/03/2015.
A era da impaciência.
Assim como os livros expandiram nossa capacidade cerebral,
as tecnologias atuais podem gerar o efeito contrário.
Por Thomaz Wood Jr.
A vida no século XXI pode não ser maravilhosa como sugerem
as propagandas de telefones celulares, graças aos consideráveis impactos
sociais provocados pela onipresença das novas tecnologias de comunicação e
informação. Dois filmes recentes tratam do tema: Disconnect (de 2012, dirigido
por Henry Alex Rubin) e Men, Women & Children (de 2014, dirigido por Jason
Reitman). As duas obras adoçam seu olhar crítico com uma visão humanista. O
grande tema é a vida contemporânea, marcada pelo consumo de bens e estilos, e
povoada pelas doenças da sociedade moderna: bullying, identidades roubadas,
comunicações mediadas e relações fragilizadas. No centro dos dramas estão a
internet e as mídias sociais.
Se determinados impactos sociais já são notáveis, alguns
efeitos econômicos ainda estão sendo descobertos. No dia 17 de fevereiro de
2015, Andrew G. Haldane, economista-chefe do Banco da Inglaterra, realizou uma
palestra para estudantes da University of East Anglia. O tema foi crescimento
econômico. O texto, disponibilizado pela universidade, é raro exemplo de
elegância e clareza, com doses bem administradas de história, economia,
sociologia e psicologia.
Haldane inicia mostrando que o crescimento econômico é uma
condição relativamente recente na história da humanidade, começou há menos de
300 anos. Três fases de inovação marcaram essa breve história do crescimento: a
Revolução Industrial, no século XVIII, a industrialização em massa, no século XIX,
e a revolução da tecnologia da informação, na segunda metade do século XX.
Qual a fonte primária do crescimento econômico? Em uma
palavra, paciência. É a paciência que permite poupar, o que por sua vez
financia os investimentos que resultam no crescimento.
Combinada com a inovação
tecnológica, a paciência move montanhas. Existem também, lembra Haldane,
fatores endógenos, a exemplo de educação e habilidades, cultura e cooperação,
infraestrutura e instituições. Todos se reforçam mutuamente e funcionam de
forma cumulativa. Pobres os países que não conseguem desenvolvê-los.
De onde veio a paciência? Da invenção da impressão por tipos
móveis, por Gutenberg, no século XV, que resultou na explosão da produção de
livros, sugere Haldane. Os livros levaram a um salto no nível de alfabetização
e, em termos neurológicos, “reformataram” nossas mentes, viabilizando
raciocínios mais profundos, amplos e complexos. Neste caso, a tecnologia
ampliou nossa capacidade mental, que, por sua vez, alavancou a tecnologia,
criando um ciclo virtuoso.
E os avanços tecnológicos contemporâneos, terão o mesmo
efeito? Haldane receia que não. Assim como os livros expandiram nossa
capacidade cerebral, as tecnologias atuais podem gerar o efeito contrário.
Maior o acesso a informações, menor nossa capacidade de atenção, e menor nossa
capacidade de análise. E nossa paciência sofre com o processo.
Não faltam exemplos: alunos lacrimejam e bocejam depois de
20 minutos de aula; leitores parecem querer textos cada vez mais curtos, fúteis
e ilustrados; executivos saltam furiosamente sobre diagnósticos e análise e
tomam decisões na velocidade do som; projetos são iniciados e rapidamente
esquecidos; reuniões iniciam sem pauta e terminam sem rumo. Hipnotizados por
tablets e smart phones, vivemos em uma sociedade assolada pelo transtorno do
déficit de atenção e pela impaciência crônica.
Os efeitos são preocupantes. A impaciência em crianças
prejudica a educação e cerceia o seu potencial. Nos adultos, reduz a
criatividade, freia a roda que gera o desenvolvimento do capital intelectual e
a inovação e coloca em risco o crescimento econômico futuro.
Haldane conclui que os ingredientes do crescimento ainda são
misteriosos, mas que a história aponta para uma combinação complexa de fatores
tecnológicos e sociológicos. É prudente observar que o autor não está sugerindo
uma relação direta entre o crescimento das mídias sociais e a estagnação
econômica que vem ocorrendo em muitos países. Sua análise é temporalmente mais
ampla, profunda e especulativa. Entretanto, há uma preocupação clara com os
custos cognitivos da “revolução” da informação, que se somam aos custos sociais
tratados nos dois filmes que abriram esta coluna. Não é pouco.
Texto e imagem reproduzidos do site:
cartacapital.com.br/revista/840
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